A mudança para o trabalho remoto encerrou os horários tradicionais: as pessoas trabalham em intervalos, à noite, entre tarefas de cuidado dos filhos e da casa e entre as intermináveis chamadas em vídeo, mensagens e e-mails. Dezoito meses após o início do lockdown, um estudo feito com funcionários das maiores empresas comprova aquilo que já vinha sendo dito. As pessoas estão literalmente trabalhando todas as horas do dia – mas quase nunca ao mesmo tempo.
Isso é ruim para a produtividade? O estudo de Arjun Narayan, Rohan Narayana Murty e Rajath B. Das, da Soroco, empresa que faz uso de machine learning para otimizar equipes, mostra que conforme a tarefa, é melhor sim ter colaboradores trabalhando ao mesmo tempo, como acontecia nos moldes pré-Covid. Para outras, em compensação, o grande número de reuniões via calls, as mensagens que pingam a todo momento e conversas com colegas dificultam a execução, fazendo com que a produtividade subisse apenas fora do horário convencional de trabalho.
Mas vamos por partes. A primeira coisa que a pesquisa ponta é que, normalmente, os próprios profissionais são muito bons em gerenciar seu próprio tempo e cumprir suas tarefas. As lideranças que tentam fazer o controle porque acham que, de alguma maneira, os colaboradores estão mentindo sobre quantas horas do dia trabalham deveriam desenvolver confiança em relação a seus times e entender primeiro em que momentos do dia são mais produtivos e por quê.
Para compreender melhor como as pessoas estão trabalhando em casa, os pesquisadores precisaram olhar para o conceito de “sobreposição de equipe”, ou seja, a extensão em que as horas de trabalho de diferentes membros da equipe coincidem. No local de trabalho, a sobreposição era algo esperado, mas com o trabalho remoto e híbrido, esse nível de sobreposição não é tão comum.
Para a pesquisa foi estudado o comportamento de trabalho de 187 profissionais em seis empresas que estão na lista Fortune 500, que fizeram a transição para o trabalho remoto em 2020. Esses trabalhadores estavam espalhados por 22 equipes, com um tamanho médio de equipe de cerca de 10 membros. Todos esses funcionários tinham anteriormente escritórios e horários de trabalho bem definidos; virtualmente nenhum deles ficou dentro do horário.
“Nossas descobertas confirmam uma verdade agora conhecida: o dia de trabalho digital nunca termina de verdade. Em média, os membros individuais da equipe estão disponíveis para trabalhar por mais de 8 horas por dia – usando a medida conservadora de “estar disponível para o trabalho” como estar em um computador de trabalho por mais de 30 minutos por hora. Em média, as equipes ficam em seus PCs por 45 minutos a cada hora, durante 6,1 horas de esforço ao longo de cada dia de trabalho de 24 horas”, escrevem Narayan, Murty e Das.
A pesquisa apontou que o dia de trabalho remoto é dividido em duas partes: uma janela de 8 horas que vai das 9 às 17 horas (nas empresas estudadas), em que os integrantes da equipe geralmente trabalham juntos, e uma janela de 16 horas, em que os membros da equipe geralmente trabalham separados. Durante a primeira janela de tempo, os integrantes da equipe em média se sobrepõem a 50-70% de seus colegas e geralmente podem ser considerados “trabalhando juntos”. Durante a janela de “horas de folga”, mais longa, os membros da equipe se sobrepõem a 10–50% de seus colegas e, portanto, podem ser considerados como trabalhando separados.
Na janela das 9h às 17h, quando houve maior sobreposição, os pesquisadores perceberam dois picos: às 10h e às 15h. Fora dessa faixa, havia trabalhadores conectados em praticamente todos os horários do dia. O que levou à conclusão do que vinha sendo dito até agora, mas sem dados:
- os trabalhadores digitais estão trabalhando em horários dos mais diversos sozinhos
- o dia de trabalho digital é verdadeiramente infinito
- as equipes digitais geralmente não estão todas juntas
- as restrições de horários de alimentação e pausas são muito mais importantes durante o dia de trabalho digital.
A sobreposição – maior ou menor – da equipe foi um fator importante para a produtividade. Olhando-se para o gráfico, é possível ver como a produtividade por hora está relacionada à sobreposição da equipe de formas diferentes. Os processos de negócios realizados pelas equipes se enquadraram em três categorias.
- 41% dos processos tiveram um impacto positivo, com a possibilidade de ter um colega para ajudar com informações. Isso foi especialmente verdadeiro em tarefas como finalizar taxas para cotações de seguro, criar e aprovar planos de produção e gerenciar mudanças no estoque.
- 33% dos processos tiveram um impacto neutro, em que a produtividade não dependia do horário em que as tarefas eram concluídas. Um exemplo de tal trabalho inclui a criação de pedidos de compra e monitoramento do status de oferta e demanda de produtos e alocações de armazém.
- 26% dos processos tiveram impacto negativo, com uma produtividade 28% menor durante o horário regular de trabalho. de negócios foram correlacionados negativamente com a sobreposição da equipe. Exemplos de tal trabalho incluem liberar pedidos de compra e atualizar os detalhes dos funcionários em um banco de dados.
A sobreposição – maior ou menor – da equipe foi um fator importante para a produtividade. Olhando-se para o gráfico, é possível ver como a produtividade por hora está relacionada à sobreposição da equipe de formas diferentes. Os processos de negócios realizados pelas equipes se enquadraram em três categorias.
Para as lideranças, os pesquisadores apontam alguns aprendizados. Os mais importantes:
Arranjar tempo para que os colaboradores estejam juntos. A liderança deve estabelecer “horas juntos”, em que se espera que 50% da equipe estejam online e trabalhando juntos. Nos dados do estudo, as equipes tinham em média 7 horas ou mais no dia de trabalho, durante as quais mais da metade da equipe estava sempre online. Essas horas também devem ser aproveitadas para agendar processos de negócios que se beneficiam de uma maior sobreposição de equipe – bem como tomar e comunicar decisões que afetam todo o grupo.
Não forçar a sobreposição. A preocupação maior não deve ser se sua equipe não está se sobrepondo em um bloco contíguo de 7 horas, ou se a equipe não consegue atingir 50% de sobreposição o tempo todo. Em cada equipe, há processos que parecem ser mais bem executados individualmente, em momentos de baixa sobreposição.
Não tentar microgerenciar as equipes. Essa pode ser uma grande tentação para lideranças que têm dificuldade em lidar com o trabalho remoto ou híbrido. A liderança tem que permitir que seus funcionários tenham flexibilidade para programar seus processos de negócios de acordo com suas preferências pessoais de tempo. Como já foi dito, os colaboradores têm uma boa ideia de como gerenciar seu tempo.
Permitir que as pessoas se desconectem. O burnout tem sido um dos maiores problemas de saúde mental durante a pandemia. Portanto, desconectar é fundamental. A liderança pode estabelecer regras para que os membros de sua equipe dediquem tempo e espaço para realizar um trabalho focado. Pode acontecer de duas formas: tempo de “cabeça baixa”, ou seja, horas específicas no calendário em que nenhuma reunião da equipe deve ser agendada e os membros da equipe não devem entrar em contato uns com os outros, a menos que seja absolutamente necessário, e sinalizadores de “não perturbe” que os indivíduos podem use para sinalizar quando eles precisam se concentrar. E, terminado o dia, nada de mensagens que podem esperar até o dia seguinte, mesmo sabendo que o colaborador costuma ir até tarde. Lembre-se que aquele pode ser seu tempo mais produtivo no dia.