Fintechs são as startups que mais atraem investimentos no Brasil. Só em agosto, elas levantaram 36 aportes que representaram a maior parte do total de R$ 10 bilhões movimentados pelo ecossistema de startups do país, segundo o Slinghub.
O capital de risco e o corporate venture estão de olho nas oportunidades que o cenário econômico brasileiro cria para empresas de tecnologia do setor financeiro. Uma delas é a enorme parcela da população que não utiliza serviços bancários: os desbancarizados. Em todo o país são 45 milhões de pessoas, de acordo com levantamento do Instituto Locomotiva. Esta população movimenta R$ 817 bilhões ao ano.
Não se trata, porém, de uma tendência exclusiva do Brasil: mundialmente, fala-se em uma “oportunidade de US$ 100 trilhões”, impulsionada pelos países emergentes. É, além de tudo, uma questão social em meio a um cenário econômico em crise. “A pandemia de coronavírus provavelmente levará muitas pessoas à pobreza e dificuldades econômicas. A inclusão financeira desempenhará um papel cada vez mais vital para os menos favorecidos”, afirma análise do Fórum Econômico Mundial.
O que é mais animador para as fintechs e investidores é o fato de que 60% dos desbancarizados no Brasil têm acesso à internet em aparelho celular. Ou seja, há uma barreira a menos para aquisição de mais da metade destes clientes em potencial.
Os dados sobre os desbancarizados foram obtidos e divulgados antes da pandemia e, portanto, do auxílio emergencial promovido pelo Governo Federal. “Se é verdade que a pandemia escancarou a desbancarização, por outro lado acelerou a digitalização financeira. Mas o desafio não é só aumentar os bancarizados, mas sim fidelizá-los”, reconhece Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, em entrevista ao Estadão.
Neste sentido, as fintechs também olham para os sub-bancarizados, outro contigente de milhões de brasileiros que até têm conta bancária, mas não utilizam os serviços financeiros. “Recebem o salário e já tiram da conta, porque não podem pagar as taxas de transferência”, explica Stephanie Fleury, fundadora da fintech DinDin, à The Shift.
Há, portanto, um mercado consumidor pouco explorado pelos grandes bancos, parcialmente digitalizado e que movimenta mais dinheiro do que qualquer fintech sonha em colocar as mãos.
Hoje, diversas startups no Brasil afirmam ver os desbancarizados como público-alvo.
A Celcoin é uma delas. A startup, que levantou aporte de R$ 23 milhões em outubro, permite que empresas locais e autônomos atuem como agentes financeiros, aproximando a população de serviços financeiros sem precisar ir a uma agência. Um estudo conduzido pela fintech mostrou que a solução, na Paraíba, diminuiu em 44 minutos o tempo médio, além de 1,8km em deslocamento, gasto por uma pessoa para resolver suas questões financeiras.
Destaca-se também nesse segmento a Jeitto. Olhando para as classes menos privilegiadas da sociedade, a startup oferece crédito “para pagar as contas do mês”, sem necessidade de conta bancária.
A Migo é um caso raro de startup que nasceu na África e aterrissou no mercado brasileiro. “Não importa se o cliente tem uma conta bancária ou não. Estamos prontos para atender as classes C, D e E”, diz Ekechi Nwokah, presidente da fintech nigeriana, que atua por meio de parcerias com o varejo.
Neste cenário, será preciso avaliar em que medida o PIX impactará a inclusão financeira e digital. A ideia do Banco Central é exatamente estimular o uso de meios digitais de pagamento e democratizar o acesso dos brasileiros ao sistema financeiro. Ao mesmo tempo, qualquer empresa poderá operar como uma fintech, seja com operação própria ou distribuindo serviços financeiros de terceiros. Portanto, o mercado tende a ficar ainda mais concorrido.
Entre as startups que focam no público desbancarizado para crescer está a UME. Depois de apenas um ano de operação, a tecnologia da fintech processa R$ 500 milhões em crédito com a Havan, um dos varejistas parceiros. O modelo de negócio da UME é baseado no crédito em ponto de venda, com um sistema de análise de risco que vai além dos bureaus tradicionais e pode incluir até negativados. A taxa de aprovação é de 37% e o ticket médio próximo aos R$ 170.
The Shift: Qual o diferencial da tecnologia da UME?
Berthier Ribeiro: “Nossa tecnologia foi criada dentro da academia, testada e validada com o maior varejista do norte do país e então replicada para todo o Brasil. Os resultados mostram que é possível aprovar crédito para 30% a mais de usuários que a média do mercado com o mesmo risco. O importante é entender que cada região do país necessita um modelo diferente. Um determinado dado nem sempre tem o mesmo peso no sul e no norte. É possível encontrar bons pagadores que pareciam mau pagadores aos olhos dos bancos”.
The Shift: Por que oferecer crédito no ponto de venda?
Berthier Ribeiro: “Historicamente, a maior parte do crédito oferecido para as classes C, D e E no Brasil foi feita por meio do varejo, seja pelos próprios varejistas ou por instituições financeiras parceiras. Mas é um mercado que opera da mesma maneira há trinta anos e há grande espaço para melhorias, não só do ponto de vista de tecnologia como de experiência de cliente e qualidade de produto”
The Shift: Qual é o propósito da UME?
Berthier Ribeiro: “No final do dia, nossa missão é dar a mesma ou ainda melhor condição de crédito que tem um correntista do Itaú ou do Nubank para os desbancarizados e os negativados ,assim melhorando a vida financeiras dessas pessoas. É isso que move a cultura da empresa e baseia todas as decisões”.
The Shift: O ecossistema brasileiro de fintechs está cada vez mais concorrido. O que define quem terá sucesso neste cenário?
Berthier Ribeiro: “A capacidade de execução vai definir as que vão perdurar, as que vão crescer e as que infelizmente vão morrer pelo caminho”.
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