Tempos atrás, a fórmula para uma empresa de tecnologia ganhar valor de mercado costumava ser muito clara: quem cresce em faturamento também cresce em valor de mercado.
Negócios estavam sendo avaliados em 30x, 40x ou até 100x o seu run rate, uma medida que chega a valores ainda maiores que o faturamento, para o caso de uma empresa em crescimento. Lembrando que run rate é uma forma de extrapolar a receita mensal ou trimestral e projetar para o ano. No caso do trimestre, ela é calculada multiplicando por quatro a receita do último trimestre.
Porém, empresa nenhuma paga as suas contas com faturamento. Na vida real, pouco importa ter uma primeira linha (faturamento) crescente, se nada disso chegar na última linha (lucro) do negócio.
O problema é que nas fases iniciais de uma startup, o prejuízo é a regra, e não a exceção. São necessários investimentos pesados em áreas como pesquisa e marketing para que um bom produto seja colocado no mercado.
Tanto negócios de grande potencial, quanto negócios completamente inviáveis, geralmente passam por essa situação. Primeiro vem o investimento, que se manifesta como prejuízo, e só depois vem o lucro.
Na expectativa — embasada ou não — das coisas se tornarem diferentes no futuro, os investidores colocavam dinheiro em negócios que estavam se comportando conforme o padrão da figura 1.
Os negócios de sucesso na área de tecnologia possuem uma característica quase mágica: cada novo cliente traz naturalmente uma nova receita para o negócio. Mas, ao contrário do que acontece na economia tradicional, o custo que ele traz é praticamente zero. Isso é o que o mercado chama de escalabilidade, ou alavancagem operacional.
Quem está na situação do gráfico da Figura 1, vive na esperança de que, após ganhar uma certa escala, esse padrão comece a se inverter, mais ou menos como está na Figura 2.
De fato, é exatamente isso que acontece nos bons negócios — que por definição são uma minoria. Muitas vezes, os fundamentos não são tão bons, e o que acontece é apenas uma extrapolaçao da situação inicial (Figura 3).
Mas se todo investidor e executivo minimamente sofisticados sabem que escala não é garantia de sucesso, por que esse risco vinha sendo tolerado até outro dia e agora ele se tornou motivo para demissões e cortes de custos?
Bem, agora a gente vai ter que dar um salto enorme, e sair do mundo das unit economics direto para a macroeconomia.
Com o capital abundante e barato que existia antes, o mercado não demandava tanta garantia de retorno. Na verdade, com custo baixo de capital, o retorno poderia até nem ser tão alto assim, e ainda ficaria acima do seu custo.
Com dinheiro de sobra, os empreendedores também não precisavam dar provas tão sólidas de que realmente existiria uma alavancagem operacional no negócio.
Não há mal nenhum em não gerar lucro por algum tempo. O problema é não conseguir mostrar um caminho que leve até essa lucratividade. Com taxas de juros em elevação, os investidores não estão mais dispostos a pagar para ver.
De fato, algumas empresas sentiram uma queda de resultados que pode ser atribuída à alta dos juros. Outras, nem tanto.
Mas todos querem cuidar dos seus recursos com mais cuidado agora. Afinal, se notícias ruins não chegaram, provavelmente é apenas questão de tempo para elas aparecerem.
Nesse novo cenário, não adianta ter bilhões no caixa e nem ter um lucro extremamente elevado. Esses fatores até reduzem a pressão por demissões, mas quando a liquidez monetária sofre uma contração, não dá para continuar com projetos que não tenham uma perspectiva clara de retorno.
O que estamos vivendo agora é basicamente isso. Qualquer outra questão política, ideológica ou mesmo psicológica que seja colocada não passa de uma questão secundária, ou simplesmente equivocada, para a compreensão do momento.
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