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Do monopólio das Big Techs à crise da solidão: o futuro segundo Scott Galloway

Provocações do Professor G: a convergência entre tecnologia e dinheiro está redefinindo nossa visão de mundo, e o maior impacto da IA será na solidão

Por Soraia Yoshida 08/03/2025

Scott Galloway, conhecido por seu humor ácido, critica os CEOs das Big Techs na nova gestão Trump (Imagem: montagem via YouTube)

As previsões de Scott Galloway são o ponto de partida para que o professor da New York University (NYU) mostre como a convergência de tecnologia e dinheiro – muito dinheiro – estão afetando nossa visão de mundo. “O maior impacto da IA não será na economia, mas na solidão”, disse ele diante da platéia da SXSW 2025. Com sua abordagem incisiva e repleta de dados, Galloway destacou transformações em mercados emergentes, a ascensão da IA, a concentração do poder empresarial e o impacto social da tecnologia.

Entre as principais predições de Galloway está o impacto da solidão na economia e na sociedade – ao qual se referiu como “Lonely Economy”. “As empresas mais inteligentes e com mais dinheiro estão essencialmente tentando convencer os jovens, principalmente os homens, de que podem ter uma vida razoável em uma tela com um algoritmo”, alertou. Ele citou o aumento da popularidade das “namoradas virtuais” movidas por IA e a queda na taxa de relacionamentos entre os jovens. “A busca por ‘AI girlfriend’ explodiu. Isso está criando uma geração de homens assexuais e antissociais”, afirmou. 

Dados apresentados mostram que um em cada três homens abaixo dos 30 anos não tem uma namorada, enquanto duas em cada três mulheres dessa mesma faixa etária têm um parceiro, refletindo uma mudança nas dinâmicas sociais. Galloway alertou que essa mudança pode levar a um aumento no isolamento social, misoginia e até mesmo radicalização. “Quando os jovens não se conectam com o trabalho, com a escola e com os relacionamentos, eles se tornam mais vulneráveis a teorias da conspiração e conteúdos misóginos e nacionalistas”, explicou.

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Para mostrar o alcance da IA, Galloway usou o exemplo do TikTok para explicar a ascensão da IA na criação de experiências otimizadas para o usuário. “O maior erro do Marketing é acreditar que as pessoas querem mais opções. Escolha é um imposto cognitivo. O TikTok é Netflix com uma camada de IA que elimina a escolha e te dá apenas o que você quer ver”, afirmou.

Ele também previu que IA vai impactar setores antes intocados. “Por que eu deveria escolher um carro? Meu histórico de compras e meu estilo de vida deveriam indicar a melhor opção e ele simplesmente ser entregue na minha casa”, disse.

OpenAI, Nvidia, Meta e o domínio das Big Techs

Logo no início da apresentação, Scott Galloway deixou claro que nem sempre acerta suas previsões, mas que isso não o impede de trazer sempre muitos dados e fatos na hora de mostrar suas apostas. Olhando para a disputa entre empresas pela supremacia da IA, ele chamou atenção para a parceria entre OpenAI e Nvidia – ou “OpenVidia”. Segundo ele, as duas empresas estão dominando a chamada revolução da IA.

“A OpenAI está avaliada em US$ 300 bilhões, com o SoftBank liderando o investimento, apesar de ser histórica e notoriamente um dos piores investidores de todos os tempos”, afirmou referindo-se à holding de investimento comandada por Masayoshi Son. Galloway ressaltou que a Nvidia, que domina o mercado de GPUs, viu seu valor de mercado crescer exponencialmente. “Jensen Huang, CEO da Nvidia, já chegou a valer mais que a Intel e, em certos momentos, mais que a Boeing”, citou ele em dado momento. A fortuna de Huang está avaliada em US$ 98,9 bilhões, enquanto o market cap da Intel está pouco acima de US$ 89 bilhões. “Isso mostra o tamanho dessa revolução”.

A lista de previsões de Scott Galloway para 2025

Para Galloway, a IA não é uma moda passageira, mas sim a maior transformação desde a Internet. Isso significa novos mercados e oportunidades. “A IA não vai matar empregos, vai criar novos, como sempre aconteceu”, disse.

Ao contrário do que muitos pensam, diz o professor da NYU, a IA não será dominada por um pequeno grupo de empresas para sempre. Ele previu que a tecnologia será amplamente disseminada, tornando difícil para qualquer empresa manter um monopólio. “Achamos que IA vai enriquecer poucas empresas, mas isso não é verdade. Como foi com os computadores e a Internet, o maior beneficiado será a sociedade. Stakeholders ganharão mais do que acionistas”, afirmou.

Ele citou exemplos como as vacinas e a aviação para mostrar como tecnologias transformadoras beneficiaram a humanidade mais do que empresas específicas. Para ele, a IA seguirá esse mesmo caminho.

A previsão de Galloway é que “infelizmente”, a Meta pode ser a empresa que mais se beneficiará da IA nos próximos anos, devido ao volume de dados que possui. “Nove em cada dez pessoas fora da China estão em uma plataforma da Meta. Isso significa que a Meta tem a maior fonte de dados para treinar seus modelos de IA”, explicou. Ele previu que a Meta pode superar empresas como OpenAI e Google em termos de avanço da IA, simplesmente por ter mais dados do que qualquer outra empresa no Ocidente.

A crescente concentração do mercado nas mãos das “Magnificent 7” (Apple, Microsoft, Nvidia, Amazon, Meta, Google e Tesla) também foi um ponto de destaque da apresentação. “Essas empresas agora representam dois terços dos ganhos do S&P 500. Se você não tem ações dessas empresas, sua carteira de investimentos provavelmente ficou para trás”, disse Galloway.

Além de sua enorme valorização, o que diferencia essas companhias é o dinheiro em caixa, que lhes permite comprar e investir em companhias com tecnologias emergentes. “Google, Microsoft, Meta e Amazon agora gastam mais em CapEx do que muitos países. Estávamos acostumados a ver governos liderando grandes inovações, mas hoje, é o setor privado que tem o maior poder de transformação”, resumiu.

IA na educação e no trabalho, além de uma visão social

Galloway argumentou que a IA poderia transformar a educação e o mercado de trabalho, tornando-os mais eficientes e menos burocráticos. Ele criticou o sistema educacional elitista e disse que a IA poderia acabar com o estresse do processo seletivo. “A IA deveria dizer: ‘Baseado nas suas notas, hábitos e preferências, aqui estão três universidades que combinam com você’. Isso eliminaria anos de ansiedade desnecessária”, disse.

O professor também afirmou que o impacto da IA no mercado de trabalho será semelhante ao de outras tecnologias. “Toda tecnologia deveria acabar com empregos. A automação deveria ter destruído a indústria automobilística. O que aconteceu? Mais empregos surgiram. A IA não será diferente”.

Durante toda a apresentação na SXSW 2025, Scott Galloway criticou o estado de coisas que vivemos atualmente, chegando a dizer “O que o dinheiro fez conosco?”. Perto do final, ele falou sobre a crescente desigualdade econômica e a dificuldade dos jovens em constituir família. “Minha taxa de imposto média nos últimos 10 anos foi de 17%. Os 25 mais ricos dos EUA pagam uma taxa média de 6%”, denunciou. Para ele, “o futuro depende da capacidade dos jovens de encontrar parceiros, ter filhos e criá-los sem o peso insuportável da insegurança econômica. Precisamos reestruturar nosso sistema tributário e políticas de suporte para alcançar isso”, concluiu.

Ele também comentou sobre o papel da educação e da inclusão social. “O fracasso escolar e o isolamento dos jovens, especialmente dos homens, têm efeitos devastadores. Se um homem não teve uma relação estável até os 30, ele tem uma chance de 33% de se tornar dependente de substâncias”, disse. Na política, Galloway apontou a crescente polarização e o papel das redes sociais. “As Big Techs entenderam que a raiva gera mais engajamento do que a alegria. Elas estão viciadas nisso, e isso é um problema global”.

Falando sobre a presença dos CEOs das maiores empresas de tecnologia na posse do presidente Donald Trump, Galloway não mediu palavras e classificou essa atitude como um exemplo do que chamou de “dominó da covardia” no setor corporativo, onde líderes empresariais justificam suas ações dizendo que estão apenas “agindo em nome dos interesses dos acionistas”, mesmo quando isso implica apoiar políticas controversas ou figuras polarizadoras.

Ele criticou a postura desses executivos, alegando que, ao priorizarem interesses financeiros imediatos, acabam normalizando comportamentos autoritários e contribuindo para um ambiente político mais instável. Em tom sarcástico, ele listou os CEOs que se recusaram a participar desse “teatro corporativo” e alertou para as consequências da proximidade entre política e os negócios.

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