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Crédito divulgação e Canva
ENTREVISTA

Como aproveitar as tecnologias emergentes?

Olivia Merquior, co-fundadora da BRIFW, e Jorge Pacheco, CEO e fundador do State, refletem sobre novas ferramentas imersivas (metaverso, RV, IoT, etc) e como podemos nos preparar para elas

Por Silvia Bassi 04/04/2023

A tecnologia não precisa ser unicamente funcional, acadêmica e complicada. Ela pode ser simples, prática, fácil de entender e evoluir em diferentes direções, assim como fez no ramo da moda, cada vez mais impactado pelo digital. Cada vez mais focado na busca pela identidade e criação de símbolos. Afinal, roupa também é um registro.

No hemisfério norte, o início da primavera deu as boas-vindas à tão esperada Metaverse Fashion Week, na qual as marcas ofereceram às suas comunidades virtuais acesso restrito a experiências digitais imersivas vinculadas a recompensas físicas e digitais.

Além disso, marcas de luxo partiram em busca de parcerias com os pioneiros da Web3. A Balmain começou a colaborar com a Space Runners para levar sua silhueta de tênis Unicorn para o metaverso e a Gucci e a Yuga Labs embarcaram em uma parceria de vários anos.

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“A Web3 está em construção, o caminho é o de observar e prestar atenção em quem está fazendo a transformação. Para mim, a questão não é entrar no metaverso, mas sim se você consegue sair dele, uma vez lá dentro”, afirma Olivia Merquior, fundadora da BRIFW – Brazil Immersive Fashion Week.

Também testemunhamos um aumento de projetos que destacam a feminilidade divina, como o inovador mecanismo de busca social Diem, que usa IA para responder às perguntas pessoais das mulheres que o Google não faz. Aliás, a IA Generativa chegou chegando ao mundo fashion, com potencial de ajudar as empresas de moda a se tornarem mais produtivas, chegarem ao mercado mais rapidamente e atenderem melhor os clientes.

Para entender um pouco mais a respeito dessa fusão entre real e virtual, na moda e na cultura, a The Shift fez uma entrevista exclusiva com os principais líderes do projeto NR_Lab, resultante da união da BRIFW com o hub de inovação STATE, para fomentar a pesquisa e desenvolvimento de talentos e projetos digitais focados em soluções para a indústria criativa, como a moda.

“Ao juntarmos o ecossistema do centro de inovação STATE com a BRIFW, no fim de 2022, criamos uma grande rede global conectando artistas digitais talentosos, empreendedores e grandes marcas”, explica Jorge Pacheco, diretor e fundador da STATE.

Confira.

Revolta dos nerds

Olivia: Eu sempre fui uma pessoa da moda, sempre gostei de me vestir de uma maneira um pouquinho diferente. Por mais que eu quisesse esconder, eu chegava nos lugares e as pessoas me perguntavam se eu trabalhava com moda. Então, eu pensava ‘nossa eu sou um grande clichê, né? Eu sou um clichê ambulante’.

Mas, recentemente, houve dois episódios que me chamaram atenção. O primeiro deles eu estava no shopping, numa ótica, e eu fui comprar um óculos diferente da Oakley, daqueles meio de esqui que está usando agora e tal, eu achei bacana. Aí a vendedora ficou me olhando de longe, e ela pergunta se eu faço esporte, respondo a ela que não e ela insiste ‘você não anda de bicicleta?’. Ou seja, a funcionária estava querendo saber o motivo de eu estar com aqueles óculos. Então, ela falou ‘eu posso chutar? Você trabalha com games, não é?’. Foi a primeira vez que uma pessoa olhou para mim e, pelo fato de eu me vestir de uma maneira mais extravagante, não me relacionou com moda e sim com games.

O segundo momento foi numa roda de jovens, filhos dos amigos do meu pai. A gente estava viajando numa casa de praia, em São Paulo, eles não sabiam o que eu fazia, e meu pai ficou brincando e perguntando ‘vocês acham que ela trabalha com o quê?’.

E eles começaram a falar ‘ela trabalha com game’, ‘ela trabalha com tecnologia’, ninguém mais falava moda. Eu achei isso interessante, porque durante muito tempo, a galera de ciência da computação, os programadores, a galera que trabalha com 3D, eles eram pessoas que ficavam atrás dos computadores de uma maneira anônima e ninguém sabia onde eles viviam, onde eles dormiam, o que eles comiam.

A gente que está trabalhando com o metaverso até brinca falando que estamos vivendo a revolta dos nerds, porque eles vieram à tona e agora estão se vestindo de uma maneira extravagante e tendo orgulho do que fazem.

Eles saem das garagens escuras onde todos os programas eram feitos e começam a ganhar protagonismo e viram uma referência do que uma geração gostaria de ser, porque realmente aprenderam a lidar e têm um conhecimento secreto, que são essas linguagens. Que talvez, no passado, quem sabia latim e francês, tinha. Depois, quem sabia inglês tinha e, hoje em dia, quem sabe Python, HTML, Java.  Essas línguas secretas que abrem caminhos.

Acho que existe uma mudança de comportamento, sobre o nosso mercado, a nossa economia, os valores e os desejos dessas novas gerações.

Essas duas histórias mostram muito a mudança que a gente está tendo na nossa sociedade e, principalmente, na nossa economia.

BRIFW

Olivia: “A Brazil Immersive Fashion Week é um evento que conecta a moda com o universo digital. Quando começamos a pensar BRIFW, pensamos uma forma de trabalhar a moda, que se tornou também um lugar de expressão de identidade, de construção de identidade muito forte para diversas pessoas com questionamentos raciais, sexuais, de gênero…

As pessoas hoje usam moda como sendo esse lugar onde você constrói e fala sobre quem você é.

Aqueles que dizem que não se importam com moda, são aqueles que sempre puderam vestir aquilo que gostariam, porque você só sabe a importância do vestuário quando você quer vestir algo que a sociedade diz que você não pode, e é aí que você começa a entender a relevância que a moda carrega.

A ideia da BRIFW surgiu exatamente no momento crucial que a gente viu existirem mudanças estruturais acontecendo na tecnologia, impactando a forma com que a sociedade estava se organizando, com dois tipos de abordagem. O tipo que estava recorrente era a linguagem acadêmica, complicada, que meia dúzia de pessoas entendiam. Outra forma de pensar e de falar sobre isso, do qual as pessoas se aproximaram, é a construção da própria identidade. Então o evento nasce no momento aonde a gente vê um grande interesse da tecnologia pela moda para a criação de símbolos de desejo. O que faz com que as pessoas queiram usar a tecnologia para ir além da funcionalidade e criar uma narrativa, um storytelling da própria vida, um sentido que tem a ver com quem elas querem ser, para a construção da sua identidade. E também pela possibilidade da internet das coisas nesse universo.

Quando a gente dá um like em algum conteúdo, isso ainda é uma maneira muito rudimentar de se expressar. Se pensarmos na evolução da web 3, desse mundo conectado da internet das coisas, nossa roupa será também um lugar de registro da nossa biometria e das nossas atividades, que vão dizer para o ambiente se estamos excitados ou entediados. A partir daí, o ambiente vai se configurar para nos agradar.

Tínhamos essa intenção muito clara de aproximar as pessoas desses temas e sair do acadêmico.

A gente entende a complicação da tecnologia como um projeto político, exatamente para poucas pessoas poderem operá-la.  A nossa ideia é fazê-la como se fosse uma coisa muito simples, tão simples que você pode realmente meter a mão e desviar para o caminho que você quiser, usando a moda como meio.

Essa vontade das novas gerações de experimentar e trazer algo cobrindo o seu corpo ou até atrelado ao seu corpo, fala muito sobre essas novas expectativas que elas têm da sociedade, do futuro e dos lugares que elas estão habitando. É por isso que é tão interessante trabalhar com moda, porque a moda para mim é um registro, muito sensível e direto de coisas que estão latentes e talvez não verbalizadas, mas que já estão ali rolando no ambiente e é possível captar, eu acho que qualquer tipo de arte nos dá pistas.

O Eric Robsbawm, no livro ‘Era dos extremos’, tem uma frase ótima: ‘é impressionante como alguns estilistas são capazes de antever mudanças estruturais da sociedade antes que nós, historiadores e sociólogos’, tratando justamente dessa sensibilidade de antever.”

O NR_Lab

Olivia: “Quando pensávamos no laboratório de novas realidades, o NR_Lab, a gente percebia que quando o assunto é tecnologia, há um grande interesse nas áreas da biotecnologia, da ciência, cidade, arquitetura e dessas coisas teoricamente sérias, e a parte da cultura em si sempre fica como algo em segundo plano, porque ela não é tão funcional, ela não tem tanta utilidade direta.

Pensamos o NR_Lab exatamente como essa necessidade de falar sobre cultura, sobre o que está mudando, quais são os novos valores… Essas discussões são feitas num encontro que esse laboratório propõe, juntando a sensibilidade de artistas independentes que já estão criando objetos 3D ou brincando com algoritmo, por exemplo.

O objetivo é mostrar que a tecnologia pode ser usada de uma forma mais criativa, mais livre, e não só utilitária.

Portanto, a nossa função é juntar essa galera e também esse ecossistema maravilhoso do STATE e das grandes empresas que estão meio perdidas para entender quais são esses novos valores que estão emergindo dessas novas gerações. Juntamos esses dois campos para eles conversarem, entenderem o problema de cada um e discutir juntos para pensar em soluções que sejam boas para todo mundo.”

Caçadores de oportunidade

Jorge: “Faz 2 anos que eu e a Olivia nos conhecemos. Fomos apresentados pela Fabienne Muzy, que na época era COO da São Paulo Fashion Week. Desde o início a gente teve uma sinergia muito grande.

No STATE, uma das verticais é a criatividade, é onde estamos olhando para a indústria criativa, o que há de novo, o que está se criando através da tecnologia e como a tecnologia está influenciando essa criação. Tanto a indústria criativa quanto a cultura. A nossa cultura na sociedade. E é aí que vem também esse olhar para a moda e esse interesse, principalmente, para captar tendências.

Quando conhecemos a Olivia, ela já estava há muito tempo fazendo exatamente aquilo que estávamos começando a olhar fazia pouquíssimo tempo, prestando atenção nessa questão do comportamento, do quanto a tecnologia vem influenciando toda essa vivência com a moda e, acima de tudo, tudo o que ela já vinha desenvolvendo há muitos anos. Então teve um casamento muito grande.

Hoje o foco da nossa vertical de criatividade está no NR_Lab, juntamente com o BRIFW, onde a gente vê essa sinergia e essa conexão somando forças.

Acreditamos que o BRIFW transmite todo esse conhecimento de captar realmente essa transformação na sociedade, de comportamento, todas essas novas tecnologias, toda essa base de criador e todo esse relacionamento com a moda.

O lugar físico do STATE para reunir pessoas é importante para criarmos as experiências e trazer as pessoas para experimentarem. Além desse campus, a gente tem muito forte a nossa comunidade, que reúne desde grandes empresas a empreendedores. Acreditamos no nosso trabalho de estar realmente fomentando o empreendedorismo de base tecnológica, onde a gente também consegue ajudar essa comunidade criativa se desenvolver e se conectar.

A BRIFW já teve três edições , sendo a última realizada com o apoio da Renner. O patrocínio permitiu que a gente realizasse várias coisas, como uma sala de 8K, onde vai ter os desfiles, entre outras novidades.

Queremos funcionar como um hub de inovação, potencializar as relações, conectando empresas do nosso relacionamento e conectando a nossa comunidade de startups, que nem sempre tem ligação direta com o tema. Mesmo assim, é possível traze-los juntos para criar oportunidades, seja de negócio, de inovação…

Todo mundo aqui no STATE está, de alguma forma, demonstrando um certo interesse, principalmente grandes empresas, tentando entender onde estão as oportunidades.”

Os talentos

Jorge: “A nossa ideia é criar realmente um espaço físico aqui dentro do STATE, onde vamos ter óculos de última geração, podendo proporcionar experiências para executivos de empresas e outras pessoas que não tem esse acesso a entender o metaverso diante de uma experiência tecnológica, na prática, e não baseado somente no que a gente lê.

O lab é para isso, trazer essas pessoas aqui para vivenciar essa nova experiência.

Também tem toda a questão de conteúdo e capacitação para ajudar os executivos das grandes empresas a entenderem onde está a transformação, onde estão as oportunidades e onde podem ser aplicadas, formando uma parte curso do projeto, trabalhando toda essa base que está construindo os novos ambientes.

Estamos falando dos criadores, desde o estilista tradicional até o estilista da roupa digital, do avatar, o artista da arte digital, o pessoal que está construindo redes blockchain, enfim, tudo mais. Trazer esses criadores que realmente têm um grande ativo é o que ajudará muita empresa.

Quando a gente fala do acesso a talentos, temos um gap grande de uma dificuldade de contratação de desenvolvedores. Pensando no desenvolvimento voltado para a web 3, a gente ainda nem conseguiu mensurar a necessidade. As empresas ainda não sabem a necessidade que vão ter. As que perceberam o que está rolando e o buraco que elas já estão dentro começam essa corrida de querer contratar e aí vão ver que esses profissionais realmente não têm.

É nesse sentido que a BRIFW consegue ajudar. Tendo essa base de criadores e de talentos que estão construindo tudo isso, nós ajudamos principalmente os executivos das grandes empresas a entenderem e se relacionarem com essa base e construírem iniciativas relacionadas ao seu negócio.”

Metacultura

Olivia: “Isso não aconteceu por acaso. A gente já vinha trabalhando com a Renner, principalmente na parte de letramento interno dos colaboradores, explicando para o departamento de marketing e para o departamento de produto o que é a meta cultura e o que é a Web 3 nessa linguagem que a gente acredita que é diferente.

Trabalhamos com analogias que fazem sentido para a vida das pessoas e desmistificam o que é web 3, o que é um metaverso, o que são as realidades estendidas, por que isso está acontecendo agora, o que aconteceu no passado que foi semelhante, como a linha histórica da tecnologia vai progredindo e por que não adianta ficar sentando sentado, rezando, pedindo pelo amor de Deus que o 5G não chegue, porque vai chegar.

Então eu acho que quando a Renner entra, ela já entra num processo de observação a longo prazo. É uma chancela quando eles dizem que querem aparecer no evento inteiro, primeiro de que aquilo que a gente está fazendo é algo importante de ser observado. A Renner falou não só em patrocinar o evento em 2022 mas também quer ter prioridade nos próximos três seguintes.

Estamos falando de um problema real que a empresa está sentindo. A Renner hoje tem 400 vagas não preenchidas. A XP, por exemplo, teve que criar a XP Academy porque não tinha programador suficiente para suprir sua demanda. Isso está muito relacionado ao NR lab. Não é o operacional, mas é entender a cultura que está emergindo, os novos valores e como construir uma estratégia que faça com que as pessoas que já utilizam essas ferramentas imersivas vejam aquilo como parte da vida delas.

O que a gente propõe é que existam lugares para educar as pessoas sobre programação e linguagem, existam lugares para educar uma pessoa para fazer uma roupa digital e existam lugares para ajudar as pessoas a desenvolverem suas habilidades em criação de espaços virtuais. Hoje ainda é difícil encontrar uma comunidade para discutir meta cultura, entender o que tem valor, o que está mudando, o que engaja e o que não engaja.”

Espaço de experimentação

Olivia: “A Web 3 é complexa e em construção e é esse ‘em construção’ que é importante.

Nós tentamos aproximar  as pessoas para desmistificar o que é a web 3, criar a discussão e desafios, mostrar que o trabalho na blockchain pode ser mais divertido e encorajar a fazer parte daquele universo e passarem horas ali.

Se for só utilidade e ciência da computação chata, cansa. Por outro lado, se for algo que você tem uma comunidade, uma equipe, com um desafio, virando noite,  há o sentimento de pertencimento, de estar fazendo parte de algo maior, algo que é seu, que você está construindo.

O caminho é o de observar e prestar atenção em quem está fazendo a transformação. Eu acho que quem está indo muito bem nesse processo de entender as comunidades digitais e essa nova geração é a Gucci e, indo num caminho parecido, a Renner. Elas estão fazendo pequenas ativações, pequenos MVPs em diversos lugares e escutando as comunidades. O processo é de entender quem são aquelas pessoas, por que elas estão ali dentro, como aqueles ambientes funcionam, o que funciona e o que não funciona.

O metaverso é tudo o que vai fazendo com que a sua realidade seja híbrida com experiências não materiais digitalizadas, sendo sonoras ou visuais, como uma roupa digital. É onde a meta data começa a interagir com você de uma maneira invisível e sua vestimenta dá informação de biometria. Para mim, a questão não é entrar no metaverso, mas sim se você consegue sair dele uma vez que está dentro. Eu acho que não.

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