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Ebru Semizer está à frente da estratégia data-driven da Mercedes-Benz que tem ajudado a empresa a recuperar mercado Crédito: Divulgação
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

A IA ajuda a definir o produto certo, pelo preço certo

Modelo data-driven e algoritmos criados pelo marketing da Mercedes-Benz Caminhões no Brasil deram tão certo que serão exportados para outros mercados com características semelhantes

Por Cristina De Luca 11/08/2021

Engenheiros, designers, mecânicos e outros profissionais especializados em construir caminhões continuam trabalhando na Mercedes-Benz Caminhões do Brasil. Mas já não são os únicos que orientam a produção dos novos veículos. Eles agora contam com a ajuda de um modelo de IA que permite à montadora saber, com uma antecedência de meses, o que vai acontecer no mercado e assim antecipar suas decisões de produção, vendas e pós-vendas.

Um exemplo claro de como a tecnologia está transformando a maneira como as empresas operam. E mais ainda, de como a IA pode cumprir a promessa de oferecer experiências significativas para o cliente para construir uma lealdade mais profunda à marca e relacionamentos duradouros.

O caminho trilhado pela companhia foi passar a coletar dados de diversas fontes, não apenas da interação dos caminhoneiros com as marcas. E diferentemente de outras experiências, não olhar tanto para o passado e sim para os indicadores do futuro. “Queríamos saber como como a exportação de açúcar poderia impactar a venda de caminhões”, comenta Ebru Semizer, gerente sênior de Marketing, Comunicação e Inteligência da Mercedes-Benz do Brasil.

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Além das informações colhidas nas estradas, dos dados gerais e regionais de vendas de caminhões, de peças e estoque, a empresa passou a olhar também para dados macroeconômicos, municipais, setoriais, culturais, indicadores sociais, share de concorrência e para diálogos nas redes sociais, para fazer suas análises com uma assertividade que hoje bate em 96%.

Os insights encontrados permitem à marca antecipar tendências gerais ou setoriais em alguns meses e adotar medidas para melhorar as condições de produção e venda de caminhões ou peças, sempre de uma forma que seja vantajosa para todos, empresa e clientes. E fazer uma comunicação direcionada, sobre produto certo, pelo preço certo para cada prospect.

“Quando começamos esse trabalho dizíamos que ouvíamos as estradas. Depois passamos a entender o sotaque de cada canto do país, porque começamos a usar os dados para regionalizar a comunicação e humanizá-la”, diz Ebru.

E nesse caminhar, a Mercedes-Benz começou a perceber os dados que realmente importavam.

“O caminhão que o cliente compra vai mudando ao longo da vida dele. Então, a gente passou a olhar para o veículo como se fosse um cliente nosso. Depois passamos a mapear o ecossistema ao nosso redor. Hoje, o que faz a diferença é toda uma interação com a mídia social, a gente tem uma ligação forte que é a entrada muito forte também nas nossas agências regionais. Passamos a entender a dinâmica do transporte de carga e até as roupas que os caminhoneiros estão usando, os problemas com o tráfego e as condições das rodovias, as paradas mais usadas, e procuramos nos aproximar de todos eles. As principais paradas se transformaram em pontos de acesso WiFi nos quais a gente se comunica com os caminhoneiros. Fazemos pesquisas. Compartilhamos informações relevantes. No fundo, no fundo, estamos olhando todo o entorno do caminhão, né?”, conta a executiva.

Se o caminhoneiro autorizar, a companhia mede o desempenho de cada caminhão, os desgastes das peças e é capaz de agendar reparos programados, antes que um problema aconteça e atrase o carreto. E isso tem aumentado o engajamento.

Com base em tamanho conhecimento dos clientes, a Mercedes-Benz mexeu em todo o planejamento de mídia. Não só em relação aos veículos utilizados (rádio, TV, Internet) quanto também aos melhores horários e até quais palavras usar na mensagem, as cores que vão chamar mais atenção.

“A gente sabe o que o consumidor está buscando, qual informação ele está precisando receber naquele momento, e como faço com que ela chegue até ele”, afirma Ebru. “E isso nos permitiu planejar campanhas em curtíssimo prazo. Hoje conseguimos planejar as ações do mês que vem, não mais só as do ano que vem. Isso porque ouvimos as estradas e cada sotaque. Hoje já ouvimos cada voz. Quem sabe a gente não chega ao ponto de ouvir cada pensamento”, brinca a executiva.

“Ao sairmos da fábrica, para ouvir os consumidores, constatamos grandes diferenças entre as dores dos nossos clientes de cada região do Brasil, que têm preferências e necessidades distintas como a cor do caminhão, a configuração da cabine ou de algum detalhe mecânico. Com isso reorientamos a nossa comunicação, que ficou ainda mais empática e humanizada e associada ao nosso Big Data, e também a nossa linha de montagem, que passou a produzir modelos mais adaptáveis a cada tipo uso” explica Ebru.

“Nosso cliente é agora impactado ao longo de toda a sua jornada e de uma forma direcionada e não invasiva. Falamos o que ele quer e precisa ouvir e oferecemos soluções customizadas às suas necessidades” completa a executiva.

Em um ano atípico como 2020, fortemente impactado pela pandemia do coronavírus em todo o mundo, o mercado brasileiro de caminhões teve uma queda de cerca de 12%, em relação a 2019. As ações assertivas e a conduta adotadas pela Mercedes-Benz, sempre orientadas pela inteligência de dados que criou nos últimos anos, levaram a companhia a uma queda sensivelmente menor, de apenas 4%.

Em 2020, foram licenciados 26.769 caminhões da marca no Brasil, o que representou 31,6% do mercado. No primeiro trimestre de 2021, a Mercedes-Benz segue líder com 30,7% de participação: foram 7.508 unidades emplacadas entre janeiro e março, 24% a mais em relação às 6.053 unidades emplacadas no mesmo período em 2020. Também no primeiro trimestre de 2021, houve crescimento de 44% nas exportações de caminhões, em comparação com 2020, com mais de 1.700 unidades vendidas para o mercado externo.

A estratégia data-driven, somada à AI, foi toda pensada e criada no Brasil. Deu tão certo que a Mercedes já pensa em aplicá-la em outros países europeus com características de mercado semelhantes ao nosso, como a Turquia e a Itália, entes de aplicar na própria Alemanha.

O futuro é data-driven e inteligente

Para quem entende do mercado, ter um negócio data-driven já deixou de ser uma inovação – é um requisito competitivo. Segundo dados globais do Gartner, 86% dos executivos das maiores empresas do mundo colocam os dados e estratégia de analytics como prioridade em seus negócios para os próximos anos. Outro estudo, da McKinsey, mostra que as companhias que ainda não realizaram estas mudanças correm o risco de ficarem para trás, dada a entrada de novos competidores no mercado, que já contam com analytics em seu DNA e rapidamente estão crescendo em participação.

Além disso, as empresas bem sucedidas em sua estratégia data-driven sustentam uma cultura colaborativa, focada no compartilhamento de informações e em resultados. Seus líderes confiam nos dados e são movidos por um princípio de governança operacional. Por sua vez, as ferramentas tecnológicas têm a responsabilidade de garantir a qualidade dos dados, assim como entregar análises sólidas e ágeis.

Lideranças de arquitetura corporativa (EA) e inovação tecnológica (TI) podem desempenhar um papel fundamental na construção de uma organização orientada a dados se fornecerem uma visão corporativa das necessidades de dados mapeadas em relação às prioridades estratégicas de negócios. Profissionais de Marketing também, como comprova Ebru.

Para cada organização, a tomada de decisões é um empreendimento central que está se tornando mais complexo. Envolve considerações muito mais amplas – seus impactos potenciais estendem-se a todas as empresas – e as linhas entre as decisões estratégicas, táticas e operacionais estão se confundindo.

“A tomada de decisão eficaz exige que as lideranças  de negócios reformulem o que é essencial, quem ou o que está envolvido – e repensem como aproveitar os dados e análises para melhorar a tomada de decisões. O resultado será uma nova competência central, gerando melhores resultados de negócios”, afirma o Gartner.

De maneira crítica, não se trata de reengenharia de todas as decisões; trata-se de aplicar esse processo de pensamento reformulado às decisões mais importantes e impactantes – aquelas que não podem ser tomadas de forma eficaz com as abordagens tradicionais.

Considere que tipo de dados você precisa, quais dados você pode explorar, quais partes da tomada de decisão são melhores deixadas para os humanos e o que deve ser tratado por máquinas. E determine as colaborações que são críticas, ao invés do que você pode gerenciar. Foi exatamente o que fez a Mercedes.

Em pesquisa recente, o Gartner descobriu que 65% das decisões tomadas pelas áreas de negócio e marketing são mais complexas (envolvendo mais partes interessadas ou escolhas) do que há dois anos. O estado atual da tomada de decisão é insustentável. Para fazer a reengenharia de decisões de uma forma que lide com maior complexidade e incerteza, a tomada de decisões precisará ser mais mais conectada, contextual e contínua. Mais inteligente.

Também deverá ser muito mais inclusiva. E levar em consideração todos os stakeholders. Portanto, mais colaborativa. Examinará vários aspectos de uma oportunidade de negócio e ocorrerá onde é mais importante para o seu cliente, cidadão ou organização.

Dados e análises podem ser um ativo de negócios valioso que irá melhorar as decisões de negócios, conduzir a transformação de negócios digitais e gerar novas receitas para sua organização”, afirma Shelly Thackston, especialista sênior do Gartner. “Mas para fazer isso direito, você precisa deixar para trás falsas suposições sobre a monetização de dados e enfrentar as barreiras culturais, estruturais e procedimentais que fazem com que muitas organizações falhem”.

Um dos maiores desafios com os dados é que eles podem existir em silos, fragmentados e distantes. Diferentes grupos de negócios têm configurações individualizadas e coletam seus próprios dados para seus objetivos, mas as empresas geralmente carecem de uma narrativa abrangente e coesa. Isso torna difícil usar os dados para qualquer coisa no mundo real. Foi justamente aí que a Mercedes-Benz acertou a mão. O modelo de IA criado na empresa está completamente alinhado à estratégia e às prioridades de negócio.

Além disso, mantém um modelo de responsabilidade e direitos de decisão; implementa governança baseada em confiança dos stakeholders; valoriza a ética digital e a transparência; considera o gerenciamento de riscos e a segurança da informação; e incentiva a mudança cultural e a colaboração.

Os tomadores de decisão não precisam mais confiar no instinto; hoje eles têm evidências mais extensas e precisas na ponta dos dedos.

Novas fontes de dados , alimentados em sistemas com tecnologia de aprendizado de máquina e IA , estão no centro dessa transformação. As informações que fluem pelo mundo físico e pela economia global têm um escopo impressionante. Ele vem de milhares de fontes: sensores como os doss caaaminhões da Mercedes, imagens de satélite, tráfego da web, aplicativos digitais, vídeos e transações com cartão de crédito, apenas para citar alguns. Dependendo do negócio, esses tipos de dados podem transformar a tomada de decisão.

Novas formas de dados estão dando às organizações velocidade e transparência sem precedentes. Mas adaptar-se a uma era de tomada de decisões mais orientada a dados ou mesmo automatizada nem sempre é uma proposta simples para pessoas ou organizações. Mas há parceiros no mercado, e uma gama crescente de ferramentas e plataformas disponíveis pode ajudá-los.

Na Mercedes-Benz…

A coleta dos dados é feita a partir de uma rede estruturada que recebe informações da Mercedes-Benz Caminhões (produção de veículos, venda de peças no atacado, CRM – atendimento ao cliente etc.); de cada concessionária da rede (venda de peças no varejo, preços, formas de pagamento, serviços realizados, tempo necessário para os serviços etc.); de milhares de caminhões que já estão conectados ao Fleatboard (solução de segurança da Mercedes-Benz – consumo, quilometragem percorrida e em quais regiões, sempre com a autorização e conhecimento por parte de cada um e de acordo com a nova LGPD, ou seja, são metadados que não identificam o usuário, apenas suas ações relacionadas ao caminhão);  e do aplicativo TruckPad (geolocalização e perfil de uso, tipo de carga, tempo na estrada etc.), com o qual a Mercedes-Benz possui parceria.

O sistema de IA desenvolvido pela Microsoft – que fornece também a nuvem para hospedagem dos dados, recebe direta e constantemente informações oficiais de órgãos públicos e privados sobre safras agrícolas, inflação, cotação de moedas estrangeiras, desemprego, desempenho da construção civil, mineração, importação e exportação, informações econômicas e sociais de governos e secretarias estaduais e de centenas de municípios, de todas as regiões o Brasil; dados das concessionárias de rodovias, de meteorologia, da indústria automotiva em geral, notícias sobre obras de infraestrutura, dentre outras.

O processamento destas informações é feito pela agência MOMA, com 2 cientistas de dados, um “result officer” e um coordenador, que inserem informações obtidas por um clipping de imprensa e pela análise de perfis considerados relevantes para a geração de dados nas principais redes sociais.

Este trabalho começou há 4 anos, quando a Mercedes-Benz centralizou todos os seus dados internos; depois organizou estes dados para que fornecessem insights de uma forma estruturada para permitir a tomada diária de decisões. A partir disso o sistema foi sendo ampliado e hoje possui mais de 1 terabyte (Big Data) de dados armazenados, processados e analisados por IA.

Dentre outros benefícios, a combinação destas informações permite à Merces-Benz identificar, de forma preditiva, por exemplo, as dez cidades com maior potencial de compra de caminhões nos próximos 3 meses – dentre outras relacionadas à produção e que orientam também as campanhas de marketing, agora totalmente regionalizadas e quase que personalizadas para grupos cada vez mais específicos de consumidores.

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