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Igor Senra, fundador da fintech e neobank Cora Crédito: Divulgação
ENTREVISTA

O empreendedor como força motriz

A missão da fintech Cora é ajudar o empreendedor a atingir seus sonhos, costuma dizer Igor Senra, um de seus fundadores. Como? Oferecendo produtos financeiros sob medida para eles

Garra para empreender e vontade de fazer acontecer são ingredientes que não faltam na história empreendedora de Igor Senra, fundador da Cora.

Aos 16 anos, emancipado, e já ajudando o pai a tocar um negócio no setor têxtil, Igor decidiu abrir a própria empresa. Com a aposentadoria do pai, passou a comandar sozinho 16 lojas e 10 fábricas debaixo do guarda-chuva do Grupo Moda Mineira. Mas não se identificava no trabalho. Com a anuência da família, decidiu vender tudo e se aventurar no mercado de trabalho. Após alguns anos trabalhando na Telemig Celular e, depois, na Claro, ainda não se sentia feliz. “Ser empregado não era para mim”, conta.

Foi quando teve contato com os fundadores da empresa de pagamentos MOIP, ainda um projeto  embrionário, em uma incubadora em Belo Horizonte. E decidiu investir nele. Na MOIP, os fundadores aprenderam a competir em um mercado de gigantes, mesmo sendo muito pequenos, sempre apostando em foco, qualidade e diferenciação. Atributos que hoje impulsionam o crescimento expressivo da fintech e neobank Cora. Aprenderam também o significado da palavra propósito.

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“Enquanto conhecíamos as pessoas por trás dos pequenos negócios, acabamos descobrindo que ajudá-las era o que realmente nos movia.  Daí nasceu a Cora”, explica.

O nome do neobank vem de coragem, uma qualidade que todo empreendedor precisa desenvolver, assim como resiliência, em um mercado complexo como o Brasil.

Os primeiros clientes da fintech começaram a ser atendidos em maio de 2020, mas só em outubro a Cora passou a operar oficialmente. Hoje, oferece conta digital, cartão de débito e ferramentas de gestão, sem taxas, e já conta com 143 mil clientes. A meta é chegar a 380 mil clientes até o fim do ano.

Depois de arrecadar US$ 10 milhões em 2019, no maior investimento seed de uma fintech na América Latina, a Cora foi reconhecida pela Tracxn como uma Minicorns, categoria que lista as startups que poderão se tornar unicórnios no médio prazo. Não duvide.

Este ano, em abril, recebeu um investimento Série A de cerca de R$ 150 milhões, liderado pelo fundo norte-americano Ribbit Capital e mais Kaszek, QED Investors e Greenoaks Capital. E, esta semana, anunciou uma captação Série B de R$ 600 milhões, liderada desta vez pela Greenoaks Capital, com a participação do Ribbit Capital, Kaszek Ventures, QED Investors, Tiger e Tencent.

Os motivos do modelo de negócio estar tão valorizado e os planos para o futuro são alguns dos assuntos abordados por Igor nesta entrevista.

Disrupção é …

“Ajudar a acabar com a concentração bancária no Brasil oferecendo soluções financeiras para os pequenos e médios empreendedores. A gente não está fazendo uma disrupção só de usabilidade. Está disruptando também um modelo de negócio.

Tudo começou anos atrás, quando a gente fez a MOIP. Naquela época, existiam no Brasil só quatro empresas de pagamentos. Hoje, existem mais de 400. Elas ajudam as empresas a receber pagamentos, mas quando recebem esse dinheiro, o grosso dele escoa para os 5 grandes bancos dominantes no Brasil. Faltava alguma coisa.

A parte de pagamentos estava resolvida. Qualquer demanda que o cliente tivesse nesse sentido já era atendida de algum jeito por alguma dessas empresas. Mas faltava competitividade nos outros serviços. Essa concentração absurda que a gente tem gerou aqui no Brasil um modelo que, acho, só o Brasil tem: a gente paga caro para ter serviços ruins.

A Cora nasce visando quebrar esse ciclo perverso de preço alto e qualidade baixa.

É por isso que a gente tem tanta convicção de que o momento da Cora é esse.  O que a gente tem que fazer está aí, gritando na nossa cara.

Nos surpreendeu o quão pronto o mercado estava para receber a Cora. A gente nunca sabe se o produto está chegando ao mercado na hora certa… Chegar antes da hora é tão ruim quanto chegar depois da hora, né? E a gente pegou o mercado no momento certo.

Os nossos clientes hoje estão procurando opções de bancos digitais. E não só mais para a pessoa física, que foi a primeira grande onda. Agora a bola da vez é neobanks para negócios. E não só no Brasil. Está acontecendo o mesmo no mundo inteiro. E nós estávamos aqui, prontos, depois de 13 anos de MOIP, de ter criado a empresa do zero, com muito conhecimento sobre esse mercado. Conseguimos dar um salto e surfar a crista da onda, aproveitando uma maré que já estava legal.

Somos um neobank. Uma fintech. Assim como toda fintech é uma startup, todo neobank é uma fintech.

Desde o início, a gente tentou mostrar que o nosso jeito era diferente. Até o nome da empresa é feminino para nos posicionarmos de forma diferente do resto da turma. A gente é a Cora, enquanto o mercado fala no Bradesco, no Itaú, no Santander… até Safra, que também é um nome feminino, virou o Safra, de banco Safra. Mesmo os competidores nativos digitais têm nomes masculinos: o Nubank, o Inter, o Neon.

Além de ser um nome feminino, inclusivo, ele faz alusão a coragem e coração. Tudo o que todo empreender precisa ter, para lidar com todas as coisas que ele precisa controlar ao mesmo tempo, muitas vezes sozinhos. E quando fomos pessquisar vimos que Cora, em grego, é moça. Então, esse tripé casava muito com o nosso propósito, que é ajudar o empreendedor a prosperar.  Se você empreende, você é Cora!

Outra forma que encontramos de deixar claro que somos diferentes, na nossa oferta e nos produtos que entregamos, foi não cobrar por nada. Porque banco cobra tudo, né?  Então a gente resolveu não cobrar nada, para deixar claro que tem aquele povo lá e a Cora aqui.

Para não falar que a gente não tem taxa nenhuma, a gente cobra uma taxa só, que é a do saque no caixa eletrônico. O custo que a gente tem da transação a gente repassa. Dá R$ 6,50. É tão simples quanto isso. No mais, não tem taxa para nada.

Quando anunciamos esse modelo teve muita gente sem entender. Mas ele faz parte desse processo nosso de mostrar, de fato, que a gente é diferente. A gente quer tentar construir os nossos modelos de negócio de uma maneira que seja muito mais alinhada com  o cliente.

Todos os dias, donos e donas de pequenos negócios lidam com burocracia, complexidade, falta de apoio e acesso à informação — tudo parece jogar contra. E contra tudo isso, escolhemos nossa batalha: transformar a indústria financeira para torná-los livres. Livres para exercer as suas habilidades. Para fazer focar no que mais entendem, o próprio negócio, tendo gestão e análise financeira mais acessíveis.  Livres para crescer.

Temos três grandes tipos de clientes: empreendedores que estão absolutamente cansados de pagar tantas taxas bancárias, e se sente extorquido; aquele que tem uma experiência incrível com bancos digitais na pessoa física e quer a mesma experiência para sua pessoa jurídica; e o empreendedor que acabou de abrir uma empresa e não consegue ser atendido por um banco tradicional, que não pode esperar 60 dias para abrir uma conta.

A gente sabe que em algum momento vai competir com os outros bancos digitais, como Nubank e Inter. Tudo bem. Tem espaço para todo mundo.

O mercado é gigantesco. E já não estamos sozinhos nele. Mas qualquer 5% de market share é suficiente para ser considerado uma multibillion-dollar company. Então não necessariamente é preciso ser dono de grande parte do mercado para o negócio parar de pé. E embora o Nubank e o Inter tenham marcas muito mais conhecidas que a da Cora hoje, a nossa aposta está na especialização.

Acreditamos que o nosso foco extremo em CNPJs nos habilita a construir um produto melhor. Porque não estamos olhando para múltiplos públicos. Não há dispersão. Nossa oferta é mais específica que a deles.

Muito provavelmente esses bancos vão pegar contas de MEI, ou daquele profissional que quer só separar a conta de pessoa física da movimentação dos negócios dele. E de negócios B2C, segmento para o qual a gente também está olhando. Vamos brigar por ele mais na frente.

Essa grana que a gente recebeu, a gente vai usar para ampliar o nosso portfólio. De agora até o primeiro trimestre de 2022 a gente vai ter mais produtos de crédito, por exemplo, e uma abrangência maior, para atrair novos clientes.

A  grana que a gente recebeu de investimento vai ser usada para ampliar o nosso portfólio. De agora até o primeiro trimestre de 2022, vamos ter mais produtos de crédito, por exemplo, e uma abrangência maior, para atrair novos clientes.

Aliás, essa segunda rodada de investimento também foi muito surpreendente para gente. Para você ter uma ideia, ainda não tínhamos gastado um centavo da primeira, quando um dos investidores procurou a gente dizendo que já estava pronto para preparar a rodada Série B. Eles estavam muito impressionados com a nossa curva de crescimento. Com o fato de a gente ter mexido na meta deste ano.

Hoje a nossa principal fonte de receita na Cora é o que a gente chama de interchange. Um pedacinho da transação que recebemos quando o nosso cliente usa o cartão de débito da conta. Mas esse pedacinho sai do bolso do recebedor. Daquele para quem o nosso cliente está fazendo um pagamento usando o nosso cartão.

Se a conta fecha? Já tem uns três meses que o resultado, por cliente, é positivo. Mas empresa como todo ainda dá prejuízo. E explico por quê. Como a gente  cresce muito e custa dinheiro trazer novos clientes, a nossa turma de operação precisa crescer também. E temos uma combinação entre os sócios que a turma de operações precisa estar sempre adiantada dois meses em relação ao patamar que a empresa esteja.

Por exemplo, agora em agosto, a gente já está olhando para o operacional necessário em outubro, para poder formar as pessoas e ter o nível de qualidade que os nossos clientes estão acostumados. Hoje a Cora tem 170 funcionários e planeja fechar o ano com 270 pessoas – no começo de 2021, eram 68.

Colocamos os nossos apps nas lojas de aplicativos em maio do ano passado. Só que era um produto muito simplório. A gente tinha vergonha até.

Era uma conta que os clientes só tinham um jeito de carregar: emitindo boletos. Como a gente ainda não tinha licença do Banco Central para operar, a gente ainda não estava conectado lá no hub de recebimento de TEDs, DOCs, coisas assim.  Em outubro, com a atribuição do nosso número bancário, 403, a gente começou a poder proporcionar mais funcionalidades para os nossos clientes. Aí o crescimento explodiu explodiu de fato.

Hoje a gente cresce em média 40% ao mês em número de clientes de 60% em volume de transações.

Oferecemos uma conta digital para pequenas e médias empresas, cujo objetivo é facilitar o recebimento de pagamentos (seja por Pix, TED ou boletos) e fazer projeções de fluxo de caixa.

A  gente já sente os clientes adquirindo confiança. Começando a fazer as movimentações que, antes, faziam com os outros bancos. Tem um comportamento padrão que é muito perceptível. O cliente começa fazendo uma transação pequena. Depois ele aumenta um pouquinho. Aí, em um determinado momento, ele começa a trazer  transações maiores.

Eu acho que é um jogo de conquista mesmo,  né? O cliente tem que se sentir confortável. E a gente está super ok com isso.

Temos muitas métricas de engajamento. A gente olha para quantas transações determinada empresa faz, quanto tempo ela demora para fazer uma ativação, como é a retenção  dela… Também para quantas empresas permanecem com a gente depois de um determinado tempo. Com base em todos esses indicadores a gente percebeu que o nosso sweet spot são empresas B2B que faturam R$ 4,5 milhões por ano.

Entram nessa categoria muitas empresas de serviço. Esse é o público mais alinhado hoje com os nossos serviços. Porque hoje a gente ainda tem algumas limitações. A principal delas é que ainda não recebemos pagamentos feitos com cartões de crédito, por mais incrível que pareça, já que esse era um dos carros chefes da nossa encarnação passada. Mas estamos trabalhando para isso. Daqui a pouco vai ter crédito também.

A gente também tem algumas indústrias entre os clientes. Alguns distribuidores. Alguns atacadistas. Tem muita gente que vende no Ceasa, por exemplo, que descobriu a gente no boca a boca mesmo, e viu alguma vantagem.

O elixir do que a gente faz são os dados.  Ao mesmo tempo que a gente constrói a nossa reputação,  a nossa credibilidade junto ao cliente, a gente tem que ir aprendendo com os dados.  E em convertê-los em melhores produtos e serviços para o cliente. Um exemplo é a oferta de crédito.

Mais do que consultar o dado dos clientes no birô X ou Y,  o histórico dele com a gente nos permite oferecer um crédito mais adequado para ele. No fim das contas, é aí que a gente vai se remunerar, de fato. Por mais que a conta já esteja mais ou menos equilibrada, o jogo vai mudar, de fato, quando a gente passar a oferecer crédito.

Boa parte do nosso negócio é esse; deixar o cliente transacionar para conhecê-lo melhor e, quando ele precisar, oferecer crédito mais adequado,  considerando as necessidades e o perfil dele.

Claro, com o Open Banking vai ser muito mais fácil para as empresas mais novas, como a Cora, ampliar o portfólio. O marketplace está aberto. De um lado, o acesso maior a dados dos clientes permitirá acelerar a oferta dos serviços que nós já oferecemos.

Eu brinco que o Open Banking funciona quase como uma máquina do tempo. O cliente autoriza o acesso e a gente passa a ter todo o histórico dele, economizando anos para conhecê-lo melhor e poder oferecer um crédito decente.

O Open Banking é uma super oportunidade de fazer mais rápido

Do outro lado, a gente pode complementar serviços a partir de parcerias. Acho que o Banco Central está olhando muito para isso.

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