Toda grande mudança traz impactos, mas que não implicam, necessariamente, em amadurecimento. Da mesma forma, os choques do dia a dia podem sensibilizar as pessoas que estão no topo das organizações, mas nem sempre isso acontece.
Ouvimos e lemos exaustivamente sobre um suposto amadurecimento do board para as questões de TI nas empresas. Mas será maturidade a palavra certa? Tomemos a cibersegurança como exemplo: durante anos, ela não esteve entre os assuntos tratados nos níveis mais elevados das organizações, ao ponto de alguns CIOs terem receio de levar ao conselho a necessidade de mais investimentos na área. Depois de uma série de grandes ciberataques, esse cenário mudou — só que não foi por maturidade, e sim por medo. A possibilidade de sofrer sérios danos, ou mesmo de ver o negócio quebrar, levou o alto comando a finalmente dedicar atenção e investimentos ao assunto.
Onde houve amadurecimento de fato foi na importância do digital. Durante a pandemia, as empresas que ofertavam produtos de consumo, e mesmo uma boa parte da indústria de serviços, recorreram ao digital. As que já tinham algum planejamento desenhado tiveram que antecipar seus planos, e aquelas que não o tinham precisaram mergulhar no assunto e voltar à superfície já com soluções.
O processo transcendeu o medo e, por força das circunstâncias, gerou um amadurecimento concreto. Uma das evidências é que os executivos de TI aprenderam a falar melhor com o board, primeiro porque tiveram espaço para se fazerem ouvir; e, em segundo lugar, porque, dado o espaço, esses executivos precisaram traduzir as demandas da área para um público leigo que tem poder de decisão sobre os investimentos.
Tão concreta foi essa mudança que ela criou até um certo frenesi em torno do tema transformação digital, com muita gente falando sobre ela, mas nem todo mundo entendendo-a suficientemente.
Ao examinar esse cenário mais de perto, constatamos que a TI está organizando-se para colher frutos desse amadurecimento. Isso envolve repensar o perfil que as equipes devem ter, as parcerias a construir com as outras áreas da empresa, novas governanças a estabelecer, entender o que significa estar mais exposto ao cliente, lidar com dados mais sensíveis.
É um movimento bastante positivo. Porém, ainda há um próximo passo imprescindível a ser aprimorado — o refinamento dessa inteligência e estruturação. E esse não é um desafio exclusivo da TI ou do board e das diretorias, mas de todos juntos. Há negócios mais aptos às transformações digitais que outros, mas há empresas que estão simplesmente aderindo aos modismos e às buzzwords sem refletir o quanto eles se relacionam com a realidade de seus negócios.
É preciso separar os quick wins (ou seja, os pequenos impactos de curto prazo que criam uma espiral positiva de cultura digital na empresa) das reais transformações, incluindo as não-digitais: elas não se definem no curto prazo e têm papel fundamental na estratégia. Essa diferenciação troca a “lista geral de iniciativas” por um roadmap com fundamentação técnica baseada em uma visão futura de negócios, em que prioridades, premissas e investimentos estão alinhados entre as áreas de negócios e TI, e os projetos são patrocinados e acompanhados pelo negócio durante todo o seu desenvolvimento. Trabalhar em um cenário como esse evidencia amadurecimento.
O board, os líderes de tecnologia e todos os participantes comprometidos com a inovação do negócio precisam buscar um ecossistema de parceiros que não seja apenas de startups, mas que englobe também, por exemplo, aconselhamento, às vezes com segundas e terceiras opiniões, principalmente para saber o que esperar e calibrar as expectativas. Não faltam aventureiros no mercado, prometendo resolver tudo em “duas semanas”. Esse discurso de venda de “velocidade” encontra eco em gestores ansiosos por mudanças ou em busca de menor comprometimento financeiro com as soluções. Ambos — velocidade e investimentos — são preocupações legítimas, mas requerem uma ponderação sobre viabilidade técnica e o real impacto nos negócios. Não se pode confundir uma solução rápida com definitiva — talvez aquela seja o primeiro passo para uma verdadeira transformação.
Um raciocínio semelhante se aplica na atenção dedicada à chamada “futurologia”. Um bom futurista tem a função de provocar, lançando questões que podem conduzir a análises importantes. Essas análises precisam ser embasadas em estudos concretos, apurações e debate de opiniões, para que as previsões não sejam tomadas como verdade. E esse é outro trabalho com o qual a TI, a gestão executiva e o board podem encontrar um campo comum para debater estratégias, prioridades e premissas.
Mesmo com tudo isso, o papel do conselheiro não mudou totalmente. As empresas entendem que um conselho de administração deve ser formado por pessoas que vão contribuir estrategicamente, ou mesmo com sua reputação, para o crescimento do negócio, e que a composição desse conselho exige um mix de perfis.
Há lugar tanto para o conselheiro mais tradicional como para aquele que tem um pensamento mais disruptivo e provocador. E, claro, há ainda a questão de que o conselho seja diverso no que diz respeito à etnia, ao gênero e a outras representatividades.
O erro, na maior parte dos casos, está em trazer alguém que teve uma experiência importante em uma empresa e torná-lo(a) conselheiro(a), acreditando que sua atuação será igualmente bem-sucedida. Isso tem sido mais frequente no caso da transformação digital: alguém que comandou uma iniciativa digital em finanças ou varejo, por exemplo, é convocado para ser a voz do digital no board de outra empresa. Certamente haverá um grau de contribuição, mas a expectativa sobre o papel desse novo participante deve ser bem calibrado.
A profusão de certificações para ser membro de conselhos e a quantidade de profissionais que se sentem aptos a ocupar essa posição demonstram haver um certo “descontrole” sobre as reais oportunidades e necessidades do mercado — tal qual na Bolsa, quando períodos de especulação desenfreada são seguidos por “aterrissagens forçadas” dos investimentos.
Se por um lado fica claro que ainda há muito o que fazer e amadurecer no tratamento dos temas de tecnologia no board, é ótimo perceber que esse processo está em franca expansão, atraindo interesse e criando boas práticas que serão adotadas pelas empresas. Certamente veremos em breve bons resultados em função disso.
Quanto mais a tecnologia se espalha pela empresa, mais importante é essa relação — assim como maiores são os riscos, à medida que a TI se torna mais crítica para as operações.
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