A saúde mental é tema inescapável nas discussões atuais, na esfera pessoal e na corporativa. Alguns estudos confiáveis dão uma dimensão mais exata do porquê isso acontece: cerca de 30% dos mais de 100 milhões de trabalhadores brasileiros sofrem com burnout, segundo a Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt). Em um quadro mais amplo, a OMS (Organização Mundial da Saúde) apontou o Brasil como o país com a maior taxa de pessoas que sofrem com ansiedade, e o quinto em casos de depressão.
É ingenuidade acreditar que o trabalho é o único responsável por esse quadro. As razões são múltiplas e complexas e, entre elas, há uma de grande impacto: os danos provocados pelos dois anos de pandemia da covid-19. As pessoas passaram por diversas experiências traumáticas, como perda de entes queridos, adoecimento, privação do convívio social e até de parte da liberdade de ir e vir, estado de alerta constante combinado com medo da morte, hiper-exposição à desinformação… A lista é longa e, como não poderia deixar de ser, exaustiva.
A reboque dessa pandemia, vieram os novos modelos de trabalho. E tanto o trabalho híbrido como o exclusivamente remoto impactaram as relações interpessoais (inclusive entre líderes e liderados) e o equilíbrio entre trabalho e vida privada. Houve quem descobriu não gostar do papel que desempenhava, enquanto outros simplesmente perderam o emprego e tiveram que se reinventar. A maneira de se relacionar e de operar transações pessoais e comerciais mudou. E o ambiente organizacional, que já tinha seus vícios, desenvolveu novos aspectos nocivos, que vão além dos limites físicos da empresa.
Como indicado no início deste artigo, é possível identificar três fatores que contribuem para esse aumento da exaustão no trabalho: a cultura corporativa, a liderança direta e o próprio profissional. O ambiente empresarial exige de cada um certa malícia para sobreviver ao jogo corporativo, bem como a capacidade de pesar a agenda pessoal com a da organização, e de formar laços para que as coisas aconteçam no médio a longo prazo. Alguns se adaptam mais naturalmente a essas exigências, outros o fazem com algum custo, porque entendem não haver como escapar desse jogo, e há quem não se adapte ou simplesmente tenha se cansado dessa situação.
Sim, é preciso admitir que nem todas as pessoas são aptas a trabalhar diariamente em um escritório onde há vários níveis hierárquicos. Claro que isso não é demérito, mas alguém que se obriga a viver essa situação por uma necessidade financeira está sujeito a sentir mais fortemente a pressão. Se há uma liderança despreparada para lidar com esse perfil, o quadro piora. Saúde mental e pressão por resultados são compatíveis, desde que exista um conhecimento das habilidades e fraquezas do time, aliado a metas alcançáveis de médio e longo prazos. Infelizmente, não são todos os líderes que conseguem entender e combinar ambos os fatores.
Já ouvi alguém dizer que um bom líder é aquele que consegue transformar problemas em coisas interessantes, motivando as pessoas a tentar resolvê-los. Essa habilidade, extremamente positiva, é o contraponto à exaustão. Nessa perspectiva, as metas se tornam degraus para um objetivo maior e, quando essa “subida” existe, as pessoas se sentem motivadas a entregar o seu melhor.
O papel do líder é ser um intermediário, especialmente se ele reconhece que a empresa tem algum grau de toxicidade. Nesse caso, ele precisa vislumbrar um céu sobre as nuvens e entender que deve oferecer algo a mais. Para tanto, ele terá que fazer um papel duplo, defendendo a equipe em um nível mais alto, e pedindo ao time um voto de confiança quanto à transformação positiva que ele pode operar. É um papel muito difícil, mas possível quando o líder entende que os problemas da cultura da empresa são gerenciáveis. Isso dá espaço para que ele defenda suas ideias, implementando tantas quanto forem possíveis, e mudando o cenário.
Nesse papel de construção estratégica do líder, há uma questão que tem prejudicado seriamente a eficácia. Existe uma autocensura nas relações, oriunda de um patrulhamento extremamente divisivo, que gera um estado de alerta permanente em quem ocupa posições expostas ao contato com o outro (ou seja, quase todas). O medo de que as palavras sejam deturpadas e transformadas em motivo de conflito (como assédio moral) dificulta tratar certos assuntos às claras, inclusive assuntos corporativos.
O possível benefício que uma conversa mais dura entre líder e liderado poderia oferecer a ambos acaba não acontecendo: o primeiro fica receoso na abordagem, enquanto o segundo sente certo afastamento daquele com quem deveria ter uma relação de proximidade. Mas as empresas precisam criar caminhos para não deixar extremismos divisionistas tomarem conta das discussões. Por enquanto, não me parece que haja um progresso visível nesse aspecto.
É certo que vivemos em um mundo em que sobra post e falta diálogo. As redes sociais permitem que cada um emita opiniões sem fundamentação e se revista de suposta autoridade para isso. Opiniões passaram a ter o peso de fatos e a ser brandidas como armas ou escudo. Isso prejudica demais as relações interpessoais, dentro e fora da empresa, e colabora para manter a sensação de exaustão.
Há, ainda, outro fator grave a colaborar para esse cenário de fadiga: após a pandemia, nos tornamos mais apressados. Há pressa para atingir um cargo executivo, virar top voice, ficar milionário, se aposentar… Seja qual for o objetivo, as pessoas o querem “para ontem”. Mas na carreira, como em quase tudo na vida, há um tempo de maturação para se dar passos adiante — um tempo bem mais longo do que o imediatismo vigente quer acreditar.
Entender e administrar o tempo também tem a ver com outra questão estratégica: como reza o ditado, existe uma diferença grande entre trabalhar muito e trabalhar bem — e o trabalho remoto aumentou esse abismo, bem como a confusão a ele relacionada. O tempo despendido não tem, necessariamente, relação com a qualidade da entrega. E isso é algo que um líder precisa ajustar, não só com discurso ou treinamentos, mas principalmente por meio do próprio exemplo e das ferramentas de gestão que ele emprega.
Ainda não se passou tempo suficiente para entendermos com profundidade as implicações do cenário que vivemos. E a transformação digital dos negócios e das relações — apesar dos enormes benefícios que potencialmente pode gerar — é também parte do problema. As lideranças precisam mobilizar-se na busca de meios para tornar esse cenário melhor, e evitar que esse entendimento fique cada vez mais tardio e difícil.
Como disse o dramaturgo Bertold Brecht, “por as coisas serem desse jeito, elas não permanecerão desse jeito”.
Se os conselheiros não estão sujeitos a indicadores, como saber se as decisões que estão apoiando são mesmo as melhores para a empresa?
Qual o equilíbrio entre legado e renovação quando o assunto é gestão e atualização de marca?
Um CEO pode resolver problemas complexos do negócio em um setor onde ele nunca atuou, mas apenas o sucesso do passado não é suficiente para garantir êxito na nova empreitada.
Há quem chame essa movimentação de tendência, mas será o "executivo temporário" uma real demanda das organizações?
Entenda como as equipes de TI devem se transformar em virtude da chegada da IA e da pressão por custos mais sustentáveis.
Se uma empresa começa a “flexibilizar” seus valores, isso pode levar a uma degradação irreversível de sua missão e de suas responsabilidades.
Aproveite nossas promoções de renovação
Clique aquiPara continuar navegando como visitante, vá por aqui.
Cadastre-se grátis, leia até 5 conteúdos por mês,
e receba nossa newsletter diária.
Já recebe a newsletter? Ative seu acesso