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TRANSFORMAÇÃO DIGITAL SEM TRAVAS

Como o CEO é percebido pelo CIO – e por que isso importa ao negócio

Quanto mais a tecnologia se espalha pela empresa, mais importante é essa relação — assim como maiores são os riscos, à medida que a TI se torna mais crítica para as operações.

Por Sergio Lozinsky 29/11/2024

A percepção do CIO sobre sua liderança melhorou, resultando em uma relação mais proveitosa entre eles. Isso é comprovado pela pesquisa Jornada CIO, realizada pela Lozinsky Consultoria: entre a primeira avaliação, realizada em 2019, e a mais recente, publicada no fim do ano passado, houve um salto notável no alinhamento de expectativas e no reconhecimento de valor entre o CEO (ou mesmo o alto comando na totalidade) e o líder de TI.

Na edição de 2019, 54% dos CIOs entrevistados percebiam a contribuição e influência do seu líder direto no desempenho de suas atividades, assinalando que ele “é ativo e participativo nas decisões, fazendo uma ponte fundamental entre a TI e os objetivos da companhia”. Na edição mais recente, esse número chegou a 64%.

É um aumento importante. Mas é preciso entender que o grande alavancador dessa mudança é mais a tecnologia do que o responsável por ela. O CEO percebeu o quanto esse tema não é apenas estratégico para a empresa, mas, sim, crítico. Não só a operação se tornou fortemente dependente da tecnologia, como também a pressão dos acionistas e conselheiros por uma excelência tecnológica ficou maior. Por conseguinte, o líder de tecnologia passou a ser mais ouvido, o que lhe traz consequências positivas e negativas.

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Faca de dois gumes

Do ponto de vista favorável, vemos CIOs com mais espaço junto à alta liderança, com condições um pouco melhores para chamar a atenção do alto comando para temas de sua área, e até para aprovar investimentos. Por outro lado, esse espaço maior elevou também as expectativas sobre quais assuntos o líder de TI deve dominar e como ele deve atuar.

Justamente por conta disso, os últimos 12 meses têm sido marcados por uma “dança das cadeiras” mais dinâmica nos postos de liderança da TI.  Isso acontece, em grande parte, porque muitas das expectativas são irreais. E aqui entra um dos maiores desafios do papel do CIO atualmente: esclarecer para conselhos, acionistas, e até para os demais C-levels, qual é o real alcance de suas atribuições e o limite da aplicação de tecnologia ao negócio nesse momento. É uma tarefa difícil e arriscada, porque mesmo uma explicação realista e bem argumentada pode ser entendida como um atestado de ineficácia, como se o líder de TI não pudesse atuar na velocidade e profundidade esperadas pelos demais.

Em resposta a isso, há uma situação que se mostra cada vez mais presente nas TIs, que é privilegiar algo que dê resultado a curto prazo em detrimento de fazer o ideal. Assim, muitos CIOs entregam uma sucessão de pequenas e boas soluções. Há uma parcela de lógica nessa decisão: grandes transformações exigem tempo, e a pressão por resultados rápidos nem sempre dá espaço (ou paciência) para esse entendimento.

Porém, essa postura requer uma calibragem. Os quick wins têm o objetivo de dar algum alívio até que as grandes transformações possam ser feitas. Mas o objetivo da TI não é apenas o funcionamento do negócio, mas sim sua perenidade. Se a solução das ações imediatas se tornar a regra, a área de tecnologia estará dando passos para trás no caminho de relevância que ela própria ajudou a construir.

O CIO é o administrador da realidade tecnológica da empresa. Cabe a ele dizer se o legado é obsoleto, se as operações estão em risco, se os sistemas são ineficientes. Mas ele deve trazer esses assuntos à tona de forma estratégica, organizada, propondo planos para contorná-los.

Outros cenários

Mesmo com tantas filigranas e ressalvas, o cenário hoje é propício para uma melhor relação entre CIO e CEO. O fato de o primeiro ter ganhado mais espaço na agenda deste último é uma conquista que deve ser aproveitada. Mas é preciso atentar para outros dados que a Jornada CIO trouxe sobre essa mesma questão.

Quase 20% dos respondentes disseram que seus CEOs dão “autonomia até demais, delegando à TI decisões estratégicas e que impactam o negócio”. Esse “até demais” configura uma imaturidade por parte da liderança empresarial, que não tem uma visão clara do papel da tecnologia no negócio. Muito provavelmente, esses CEOs tratam a TI como um assunto mais burocrático, executor, do que estratégico. Mais uma vez, cabe ao CIO saber rejeitar isso de forma inteligente, deixando claro que aprecia a confiança, mas que certas decisões não são — e nem devem ser — exclusivamente de sua responsabilidade.

O estudo mostra, ainda, que 10% dos líderes de tecnologia acreditam que seu CEO “busca a TI apenas para apontar problemas e cobrá-la de resultados a curto prazo”. Nesse caso, é grande a chance de estarmos falando de lideranças mais arcaicas. Sim, elas ainda existem, porque até as empresas ineficientes podem obter bons resultados, dependendo do mercado e do contexto onde estão inseridas. O problema é que suas lideranças costumam acreditar que estão bem e que o baixo grau de maturidade tecnológica não é problema, ignorando o grau de ameaça que isso pode representar para o futuro.

Calibrando a relação

Conceitualmente, o CIO deveria ser sempre uma espécie de assessor direto para o CEO, ou mesmo para toda a diretoria, dando a eles uma análise, em primeira mão, do impacto que as ações futuras terão em termos de tecnologia, ou como serão impactadas por ela. Como tal, o CIO deve ser ouvido em decisões sobre entrar em novos mercados, pensar novos produtos, M&As, eficiência operacional, etc.

O líder de TI, por sua vez, tem que fazer esse filtro sem dar à TI um caráter de “gargalo” permanente. Uma coisa é ser realista, outra bem diferente é parecer refratário a quaisquer tentativas de mudança. Por isso que o CIO não deve restringir seu papel nessa relação a ser mero educador de questões tecnológicas, e sim alguém que age de forma consonante com os objetivos da organização e apresenta cenários que viabilizem as ideias e demonstrem riscos e custos envolvidos.

Ou seja: é uma relação de mão dupla, na qual ambos os lados podem atuar para aprofundar e aprimorar a qualidade de sua relação cada vez mais interdependente. Se a relação estiver fundada na coerência e na transparência, a tendência é que ela só melhore e renda melhores frutos ao longo do tempo, mesmo diante da crescente complexidade dos desafios de negócios e das novidades e possibilidades sempre ampliadas da tecnologia.

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