O mercado de capitais brasileiro experimenta uma transformação gradual com a adoção de tecnologias blockchain. A principal proposta de valor da blockchain no mercado de capitais reside na unificação dos fluxos informacionais, de pagamentos e de ativos em um único ledger (livro-razão) distribuído.
Esta convergência permite que as conciliações das operações em securitização de dívidas, por exemplo, sejam feitas de forma automatizada, determinística e potencialmente em tempo real – uma mudança paradigmática em relação aos sistemas atuais, onde esses fluxos operam de forma fragmentada por meio de múltiplos intermediários e sistemas legados. Contudo, para capturar o verdadeiro potencial dessa inovação, é essencial evoluir além das representações digitais convencionais e caminhar em direção a tokens que sejam, de fato, os ativos em si.
Atualmente, a maioria dos tokens no mercado representa ativos off-chain, onde intermediários mantêm controle sobre a titularidade real dos ativos. Este modelo apresenta limitações significativas e frequentemente benefícios são atribuídos incorretamente ao uso da tecnologia blockchain.
No crowdfunding, por exemplo, os benefícios de custo decorrem principalmente da simplificação regulatória que dispensa a contratação de alguns serviços obrigatórios para ofertas de maior volume, e não da utilização de blockchain. Inclusive, a regulamentação não exige especificamente o uso desta tecnologia, já que a titularidade permanece controlada pela plataforma de crowdfunding e não pela rede.
Similarmente, a suposta vantagem do fracionamento via tokenização não é algo exclusivo da blockchain – bancos de dados centralizados podem dividir registros de ativos com igual ou maior eficiência.
Mesmo com tokens representativos, alguns benefícios são possíveis atualmente, particularmente na rastreabilidade através de registros transparentes e imutáveis. Para maximizar esses benefícios, é crucial registrar eventos relevantes na blockchain de forma granular e próxima ao tempo real, utilizando smart contracts e metadados estruturados. E, contrariamente à visão de que blockchain deve ser “invisível”, a transparência deveria ser maximizada – se o principal benefício disponível é a rastreabilidade, devemos facilitar a verificação direta das informações pelos usuários, reduzindo a dependência de terceiros.
Além disso, algumas automações de regras de negócios podem ser realizadas por smart contracts, mas é importante notar que sistemas off-chain robustos devem ser mantidos como redundância, uma vez que a movimentação real de ativos ainda ocorre fora da rede.
A transição para tokens nativos on-chain não é meramente uma evolução tecnológica, mas uma questão existencial que definirá se o mercado de capitais realizará seu potencial transformador ou permanecerá limitado aos modelos atuais. Enquanto tokens representativos exigem sistemas redundantes – mantendo tanto registros blockchain quanto estruturas off-chain tradicionais – a tokenização nativa elimina essa dualidade, criando eficiências operacionais genuínas. A diferença é fundamental: no modelo atual, blockchain adiciona uma camada de complexidade que requer sincronização constante entre mundos digital e físico; no modelo nativo, a blockchain torna-se a única fonte de verdade, eliminando reconciliações, reduzindo pontos de falha e permitindo que a programabilidade opere diretamente sobre a titularidade real dos ativos. Esta é a linha divisória entre usar blockchain como ferramenta de registro e abraçá-la como infraestrutura financeira nativa.
Quando tokens representam os ativos em si, com titularidade controlada pela rede, possibilidades transformadoras emergem:
– Prevenção de Fraudes: Smart contracts assinados com wallets autenticadas criam registros únicos e imutáveis, impossibilitando dupla emissão.
– Rastreabilidade Completa: Cada transferência de titularidade – emissão, aceite, negociação secundária, vencimento – fica registrada com identificação do responsável, valores e timestamps precisos.
– Automação Avançada: DvP (entrega versus pagamento, ou seja, a liquidação financeira) condicionado a critérios de elegibilidade, conciliação determinística com accrual de juros on-chain, e pagamentos automáticos seguindo cascatas de distribuição.
– Casos de Uso Complexos: Um inquilino poderia pagar aluguel via stablecoins, com o valor chegando instantaneamente aos investidores de um CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), proporcionalmente às suas cotas e senioridade na operação, independentemente de quantas negociações secundárias ocorreram.
– Externalidades positivas: Diversos players desenvolvem e utilizam aplicações on-chain componíveis (que permitem combinar diferentes aplicações ou protocolos), transformando fundamentalmente a forma como concebemos e operamos mercados de capitais.
A diferença entre rastreabilidade e programabilidade fica evidente em aplicações ESG. Com tokens representativos, posso verificar a posteriori evidências como ausência de desmatamento utilizadas em critérios de elegibilidade (para financiamentos, por exemplo) registradas de forma transparente e imutável. Porém, para execução automática de compras baseada nessas evidências, é necessário que o ativo nasça on-chain, permitindo programabilidade verdadeira.
Embora secundários à questão da tokenização nativa, diversos desafios técnicos requerem atenção, como:
A evolução mundial indica claramente uma trajetória em direção a tokens que sejam os ativos em si. Iniciativas como o DREX do Banco Central representam passos importantes nesta direção, embora questões como privacidade ainda necessitem de definição. Para o mercado de crédito privado, onde a privacidade é menos sensível por uma perspectiva regulatória, redes públicas oferecem alternativas viáveis.
O futuro do mercado de capitais brasileiro passa pela compreensão de que a verdadeira revolução blockchain não está na digitalização de processos existentes, mas na criação de novos paradigmas onde ativos nascem e vivem no ambiente digital. Esta evolução, quando plenamente realizada, promete não apenas eficiência operacional que se traduzirá em menores custos operacionais, mas também de uma rápida multiplicação de novas aplicações interconectadas. E quem desenvolver sistemas maximizando a rastreabilidade hoje estará mais próximo de estar preparado para um futuro programável no mercado de capitais. Quando o fluxo informacional, atualmente apenas registrado na blockchain, se transformar em fluxo de ativo real, a infraestrutura e os processos já estarão estabelecidos para essa transição natural.
Gabriel Braga é Diretor de Ativos Digitais na VERT Capital, empresa brasileira de estruturação e securitização de crédito e tecnologias digitais para tokenização de ativos.
A verdadeira revolução blockchain no mercado de capitais brasileiro virá da criação de novos paradigmas onde ativos nascem e vivem no ambiente digital, escreve Gabriel Braga, da VERT Capital
Com a ascensão da IA Generativa, o modelo de tráfego impulsionado por buscadores está colapsando. Para Chris Dixon, a solução passa pela descentralização
Com bilhões em investimentos, IA Generativa, robôs cuidadores e novos padrões de infraestrutura digital lideram as inovações globais
Crescimento de 42% em relação ao ano anterior, tornando-se a segunda região com maior crescimento neste mercado.
Tema de conversas e polêmicas constantes entre especialistas, vem sendo acalentado por gente de peso no ecossistema cripto, como Vitalik Buterin. Há riscos. E não são poucos.
Quando unimos duas tecnologias poderosas como IA e blockchain, o que podemos esperar? Aumento da velocidade na consulta de dados, insights mais acionáveis, aplicações de IoT, metaverso.
Aproveite nossas promoções de renovação
Clique aquiPara continuar navegando como visitante, vá por aqui.
Cadastre-se grátis, leia até 5 conteúdos por mês,
e receba nossa newsletter diária.
Já recebe a newsletter? Ative seu acesso