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Marcos Grilanda, vice-presidente e general manager para a América Latina da Databricks Foto + Ilustração: divulgação
ENTREVISTA

A Databricks quer que você coloque seus dados em ordem

Como a oitava empresa privada mais valiosa do mundo, e também a startup mais quente no cenário da infraestrutura de gestão de dados para IA, enxerga o futuro dos negócios com IA no Brasil.

Por Silvia Bassi 15/08/2024

“Não vai dar para você entrar, a lotação atingiu seu ponto máximo”, diz a oficial da equipe de segurança dos bombeiros na frente das portas fechadas que davam acesso à enorme sala de conferências do Data+AI World Tour 2024, realizado pela Databricks no dia 7 de agosto, em São Paulo. A lotação esgotada, e a quantidade de gente que “ficou de fora” no saguão porque chegou atrasada para ver o keynote de abertura do evento, são boas amostras do porquê da Databricks ser hoje uma das empresas globais “mais quentes” no mercado de infraestrutura de gestão de dados para analytics e IA, e de como os assuntos IA e IA Generativa estão fervilhando no Brasil entre as comunidades de negócios e tecnologia.

Avaliada em US$ 43 bilhões, e um dos IPOs mais esperados do mercado, a Databricks foi fundada em 2013 por um grupo de sete geeks com raízes profundas na academia e no mercado de open source (criadores originais do Apache Spark™, Delta Lake e MLflow). Seu CEO e cofundador, Ali Ghodsi, é um cientista da computação e empreendedor sueco, de origem persa, que também é professor adjunto na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Na Databricks, criaram a tecnologia de data lakehouse – uma plataforma aberta e unificada de dados estruturados e não estruturados para IA, na nuvem, que é uma espécie de cruzamento entre data warehouses e data lakes, turbinada pelo uso da própria IAGen.

A Databricks já captou US$ 3,6 bilhões em 12 rodadas de investimento, a mais recente em setembro de 2023, de US$ 500 milhões, que incluiu a Nvidia como um dos investidores. O aumento de capital agregou mais US$ 10 bilhões ao valuation da companhia, tornando-a a oitava empresa privada mais valiosa do mundo, segundo o Crunchbase. No ano passado, Ghodsi abriu os números de receita – US$ 1,6 bilhões, com crescimento de 50% sobre o ano anterior. Em junho passado, o CFO da companhia, Dave Conte, divulgou a projeção de terminar 2024 com uma receita superior a US$ 2,4 bilhões, um crescimento de 60% sobre 2023.

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Com tanto dinheiro em caixa, a Databricks já comprou 10 empresas. A compra mais recente, da startup Tabular, em junho, causou furor pelo valor pago (segundo o TechCrunch pode ter sido US$ 2 bilhões) e pelo movimento agressivo na direção de usar a compra para tornar o data lakehouse um padrão de mercado. A aquisição a colocou em rota de colisão explícita com a concorrente direta, Snowflake, que também queria a Tabular. Ambas brigam para ser a plataforma-chave para organizar, analisar e usar enormes quantidades de dados para IA e GenAI nas empresas. Por enquanto, a percepção dos clientes dá à Databricks 15 pontos percentuais de vantagem sobre a concorrente, no quesito “ferramentas com mais apelo” para lidar com a IA Generativa, em uma pesquisa da ETR Observatory.

O Brasil no mapa

O Brasil foi escolhido, não por acaso, para abrigar o primeiro da série de 18 eventos do World Tour 2024 da Databricks, diz Marcos Grilanda (ex-AWS), que assumiu há 9 meses o cargo de vice-presidente e general manager para a América Latina da companhia. “O Brasil para nós é um dos dez países mais estratégicos no mundo, não só pelo seu potencial de negócios, mas pelo movimento e interesse atual das empresas em investir em IA”, explica Grilanda, que concedeu entrevista à The Shift durante o evento. A operação para o Brasil começou em 2020, via Estados Unidos, e a empresa abriu formalmente um escritório local no ano passado. “A operação está crescendo rapidamente, já somos mais de 150 pessoas, e estamos expandindo a passos rápidos porque a demanda dos clientes é grande”, diz ele. Confira os melhores trechos da conversa, abaixo.

Os desafios dos clientes brasileiros

“Foi surpreendente ver que não são apenas nativas digitais (como iFood ou Nubank), que estão usando e demandando nossa tecnologia para dados e IA, mas também grandes empresas tradicionais (como Natura e Bradesco). No evento temos 20 casos de clientes locais sendo apresentados.

O primeiro grande desafio que os clientes têm, sobre a IA Generativa, é a qualidade dos dados. Porque sua IAGen será tão boa quanto a qualidade dos seus dados. Endereçamos isso há sete anos quando criamos essa categoria de produto data lakehouse. O segundo desafio é a governança. Você pega uma empresa que tem 10, 20 anos de existência, e vê que ela tem uma abundância de sistemas e cada um com dados catalogados de maneiras distintas. Elas levaram esses dados para a nuvem e aí vem o desafio de governar isso tudo. Quem pode acessar, como acessar etc. Esse é um produto que cresce à velocidade de 3 dígitos na Databricks.

O terceiro desafio é segurança. Dez em dez C-levels com quem eu converso hoje colocam a segurança como prioridade, fruto principalmente dos inúmeros casos que já aconteceram no mercado. O que eles no dizem é: ‘eu quero fazer IA Generativa, eu quero inovar, eu quero dar acesso ao usuário, mas preciso estar seguro. Como faço para não expor os dados e expor a companhia a riscos’. O dado hoje tem um valor muito alto para as companhias e o risco de expor esses dados é muito grande.”

Democratizar o acesso aos dados

“Nós fizemos primeiro uma revolução interna, dentro de casa, para poder levar aos clientes a possibilidade de democratizar o acesso aos dados. Porque até pouco tempo, o acesso aos dados era uma coisa concedida aos superespecialistas, que tinham conhecimento de programação e acessos. Só que agora, todas as áreas de negócios querem ter respostas, querem fazer pilotos, querem é inovar em cima disso.

Toda empresa, ela quer ser uma empresa de dados e AIGen. Se você olha bancos, os bancos estão se transformando em grandes fintechs, empresas de tecnologia. Grandes bancos estão fazendo uma transformação muito importante em se tornar empresas muito mais tecnológicas. Se você pega os varejistas, é a mesma coisa, eles estão muito mais focados em tecnologia. E nós queremos, por meio da IAGen, democratizar isso. Eu te dou o exemplo da nossa solução Genie, que permite ao usuário final fazer consultas em linguagem natural, independente do modelo.”

Convivendo com múltiplos modelos de IA

“Na nossa solução, é possível ver como as respostas seriam em diferentes modelos de AIGen. Porque nossa visão é que vamos conviver com múltiplos modelos e a cada semana surge um novo. Hoje não falamos mais só em Large Language Model (LLM) como também falamos em Small Language Models, e a verdade é que vão existir centenas de modelos. Mas qual é o modelo ideal para uma companhia? É aquele que dá resultado para o negócio, e não necessariamente é um só.

A possibilidade de fazer diferentes consultas em diferentes modelos empodera o usuário. Essa consulta é o grande diferencial para os negócios e eu ouço essa demanda de diferentes lideranças, de negócios ou de tecnologia. A vontade é que, independente da tecnologia, o usuário possa ser empoderado dentro das regras da companhia.”

A falta de conhecimento emperra

“Quando me perguntam porque muita coisa não vai para a produção, o que impede a aceleração da inovação, invariavelmente a resposta é falta de conhecimento. Muitas empresas começam a investir em uma tecnologia, às vezes alguns milhões, sem ter muito claro qual é o benefício do negócio. E a falta do conhecimento de como isso vai ser democratizado, de como o dado vai fazer a diferença no negócio e, principalmente, remetendo ao que falamos no começo, da qualidade do dado, emperra o projeto.

Por isso, embora sejamos uma empresa extremamente tecnológica – nossa relação de tecnólogos e vendedores é praticamente 1:1 – ajudamos as empresas com serviços profissionais e treinamento para as empresas. Há uma grande vontade, e ansiedade das empresas, por saber, por entender, para poder fazer. A gente mostra para o cliente a arte do possível.”

Os interlocutores na tecnologia

“Cada vez mais as empresas têm criado áreas especializadas de tecnologia, com assento no board, e focado no papel do CDO (Chief Data Officer). As empresas que se vêem como empresas de dados estão criando essas estruturas especializadas para fazer com que isso aconteça. O fundamental é que, seja CIO ou CDO, isso se conecte com a área de negócios. Ou você vai ter o surgimento da shadow AI. Se a área de negócio não recebe velocidade da tecnologia, ela vai atrás, fazer com as próprias mãos. A gente volta à questão da importância do empoderamento dos usuários.

Os casos de maior sucesso são os que conseguiram ter essa conexão entre as áreas e conversas ótimas para trazer ideias que vão ser realizadas. Tem coisas simples que a AIGen pode fazer por diferentes áreas e de forma rápida. Veja, por exemplo, o caso das áreas de compras. Algumas empresas compram milhares, milhões de reais por ano. São milhares de ordens de compra, cada uma com um contrato, com uma nota fiscal, com uma negociação específica. E analistas de compras precisam se lembrar disso tudo quando forem tocar uma operação. Com a AIGen como uma espécie de memória do negócio, eles podem ser alertados sobre condições anteriores e ganhar agilidade.

Atendimento ao cliente é outra área que ganha agilidade com a AIGen. Temos casos de clientes que reduziram de três dias para minutos o processo de atendimento e, como consequência, viram seu NPS aumentar. Em logística, temos o caso do iFood, que usa IA para otimização de rotas. Imagine, eles fazem 65 milhões de transações por mês. Com o uso do Databricks eles conseguem fazer 10 mil simulações de rotas por mês, reduzindo o custo a dez centavos por entrega.”

Tem bolha da IA?

“Não tem bolha da IA. Esse é um momento de muita construção, muito teste. Algumas coisas, como a gente comentou aqui, já têm dado resultados extraordinários, algumas outras coisas ainda não têm, mas a verdade é que a nossa vida está impactada para sempre. a IAGen veio para impactar o dia a dia de todos nós. Seja através do seu canal de atendimento que vai mudar, seja nas empresas de saúde, no mercado financeiro, nos investimentos… Você vê Bolsas criando seus próprios modelos de análise de variáveis. Portanto, não é uma bolha, e o conhecimento impacta muito as empresas que estão na frente, que estão investindo mais que as concorrentes para conhecer a tecnologia e experimentar. Os resultados vêm aparecendo e as empresas que estiverem melhor posicionadas vão ganhar muito com isso. Porque se você não saiu na frente, o tempo que vai levar para alcançar quem já avançou vai ser muito grande.”

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