Fundada em 2018, a fintech Traive se autodefine como uma plataforma financeira aberta que, usando dados e tecnologia, conecta toda a cadeia agrícola ao mercado de capitais. Surgiu nos laboratórios do MIT, com o objetivo aproximar o mercado financeiro dos pequenos e médios produtores, reduzindo a complexidade de dados que dificulta acesso a crédito. A missão da Traive é criar tecnologia que elimine os receios e ineficiências em investir nesse setor.
“Acesso aos recursos financeiros é crucial em momentos como este para manter o mundo abastecido de alimentos e abrir caminho para a recuperação econômica”, diz Aline Oliveira Pezente, co-fundadora e Chief of AI & Product Strategy da startup.
A necessidade de liquidez adicional na agricultura não é nova. Há décadas, o acesso ao financiamento necessário, e adequado, tem sido um desafio nos países em desenvolvimento. Isso ocorre principalmente porque entender a agroeconomia não é uma tarefa fácil para investidores!
“Nossas ofertas têm ajudado os clientes a obterem um diferencial competitivo frente ao crescimento dos desafios e riscos dos seus negócios”, diz ela.
Aline é mestre em tecnologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e passou por grandes empresas liderando áreas de inovação tecnológica, como Índigo e Cargill. O desempenho profissional a levou à lista anual do MIT Tech Review de inovadores 35 Under 35. Além disso, foi considerada pela Forbes uma das mulheres mais influentes do agronegócio brasileiro.
Com esse currículo brilhante, pela expertise técnica e corporativa, ela retornou à Traive em meados do ano passado — após algum tempo afastada — para comandar o time responsável pelo desenvolvimento dos modelos de Inteligência Artificial usados, principalmente, para interpretar corretamente os sinais de eventos de risco nos clientes, acelerar a tomada de crédito e melhorar s renegociações de dívidas.
Compreender a dinâmica do setor agrícola e interpretar corretamente os sinais de risco é difícil. Estamos falando de um sistema complexo, altamente intricado em diversas variáveis e bastante dinâmico (de difícil compreensão para credores tradicionais neste setor, imagina para novos!). Os dados são dispersos, fragmentados, não estruturados e a quantidade que precisa ser coletada, processada e interpretada para que um investidor de crédito decida de forma correta, bem informada e imparcial é massiva.
Portanto, a maioria dos financiadores percebe o financiamento agrícola como um negócio de baixo lucro e alto risco (percebido ou real) e, consequentemente, para ter a recompensa necessária para investir o seu capital neste setor, aumenta as taxas de juros, restringe os critérios de empréstimo, reduz os prazos, impõe termos de empréstimos onerosos e muitas vezes evita empréstimos à agricultura. Tudo isso para se proteger do “alto risco percebido” e buscar retornos maiores do que outros setores mais estáveis da economia.
Nessa conversa com a The Shift, Aline fala da paixão pelo campo, pela IA e pelo empreendedorismo. Reproduzimos alguns trechos abaixo.
A indústria agrícola, do ponto de vista de análise de risco de crédito, é uma das mais complexas. Quando você olha o risco de uma pessoa de créditos de consumo, de uma pessoa individual, é fácil de perceber, tem muito dado abundante, muito dado processado abundante e é fácil de você identificar os fatores para prever risco. No agro não. Você tem fatores climáticos, você tem volatilidade de preço… Mas um evento fora do Brasil, como a guerra na Ucrânia, pode afetar significativamente o que um produtor faz na Argentina.
Começamos a criar uma nova arquitetura e um novo processo de a análise de risco de crédito, de concessão, de securitização, aprovação política, onde um agente resolve esse problema dos dados, e você passa a ter modelos de risco mais justos e mais claros em relação aos riscos percebidos.
Para isso, o core da nossa infraestrutura tecnológica é Inteligência Artificial.
O que é único em nossa abordagem não é apenas a alta precisão da previsão de eventos, mas nossa capacidade de explicar as causas e fatores que influenciam esses modelos, tanto para os financiadores e agricultores.
A Traive conecta o mercado de capitais direto com o supply chain da indústria. Quando os fornecedores querem vender um produto no agro, geralmente financiam um produtor. A gente tem a tecnologia que automatiza esse processo.
Ajudamos os credores a lidar melhor com os riscos da agricultura e capacitamos os agricultores, trazendo mais informação e compreensão de como estão sendo avaliados e o que podem fazer para melhorar, contribuindo para elevar a profissionalização financeira de produtores em um segmento (pequenos e médios) em que geralmente são negligenciados.
Na prática, a tecnologia da startup permite que empresas de defensivos, revendas, cooperativas e tradings façam a análise, registro, gestão e comercialização de seus créditos em uma única plataforma. Por meio de modelos de inteligência artificial desenvolvidos pela Traive, também é feita a avaliação de risco em tempo real da carteira de crédito das empresas da cadeia do agro.
O fluxo de caixa de um produtor não é linear ou constante. Se você não olha o histórico daquela área onde está aquele produtor, você deixará de ver que ele, daqui a um ano, estará tão bem quanto ele estava seis meses atrás.
Juros é uma consequência… Quanto maior é a percepção de risco maiores os juros. Quanto menor a percepção de risco menores os juros. Esse risco é o quanto que você consegue prever um evento ou quanto você entende de um evento.
Diferente de várias fintechs que surgiram para tentar trazer mais dinheiro, a Traive decidiu criar uma infraestrutura tecnológica para que as relações entre quem produz e quem financia sejam percebidas.
Usamos vários modelos, vários algoritmos que a Traive estruturou especificamente para o padrão da distribuição dos dados do agro e dos eventos. Temos as funções matemáticas que são para o agro e com isso a gente deriva modelos que têm melhores performances. Então, não tem mágica. Tem é muito de matemática estatística no que a gente faz aqui.
Sempre tivemos noção de que o que a gente está fazendo poderia ser extensível para além da agricultura, então não queríamos um nome que nos colocasse uma barreira. Lá atrás, nos questionamos qual era o objetivo de toda a essa informação e entendemos que ela ajudaria as pessoas a prosperarem em um setor agropecuário sustentável.
Como estamos nos Estados Unidos e também expandindo para o Brasil, veio a ideia da palavra “thrive”, em inglês. Já que o core da empresa é a tecnologia e todos os nossos serviços envolvem I, fizemos essa brincadeira de falar thrive.
Mas como a gente atua no Brasil, nos perguntamos como um brasileiro pronunciaria a palavra, aí mudamos para Traive.
O que quase ninguém sabe, é a história oculta por trás desse nome, se você troca a ordem de algumas das letras, a palavra se transforma em true AI.
Eu e o Fabrício, co-fundador da Traive que também é meu marido, fomos o terceiro casal da história do MIT que eles aceitaram casados juntos no mesmo ano. Quando comecei com a ideia da Traive, o Fabrício sempre falava ‘Espera aí, você tem que pensar aqui no mercado de capitais’ e uma coisa foi evoluindo para outra. Só que a gente era empreendedor jovem. Com muita dívida dos estudos que fizemos. Então tivemos que tomar uma difícil decisão, eu saí da Traive e o Fabrício continuou.
Durante esse tempo, fui chefe da área digital global da Cargill, ganhando mais experiência. Também fui global head do marketplace da Indigo. Depois voltei para a Traive para liderar a área de IA e products strategy.
Eu acreditava muito que essa indústria de agro ia ser mudada pela tecnologia, principalmente por ciências de dados, então decidi largar tudo na minha carreira e estudar no MIT.
Hoje estou morando em Boston. Temos um time aqui, um time em Minneapolis e outro em São Paulo. Na verdade, a gente tem pessoas full time em diferentes lugares.
Nas empresas de tech, temos que abrir as nossas fronteiras de contratação. Então a Traive também tem pessoas na Argentina, em Gana…
O tipo de tecnologia que a gente desenvolve e o que a gente faz tem uma vocação e estamos aqui em Massachusetts para estarmos perto do que está em desenvolvimento tecnológico. Mohamed Ghasemi, que é o nosso VP de data Science, ganhou um prêmio de ser um dos melhores escolars dos Estados Unidos em IA. Tem várias publicações, MIT, phd, então a gente acaba pegando também muitas dessas pessoas para virem para o nosso time.
Não somos banco, não colocamos nosso balanço em risco. Somos uma empresa de tecnologia de infraestrutura. Temos a tecnologia que está desde a origem desse crédito, que nasce com um produtor querendo comprar a prazo.
Fazemos todo o workflow do crédito, desde a coleta dos dados, processamento e geração de um score, geração de um limite de crédito, toda automatização da política de crédito dessas aprovações que viram um recebível, automaticamente alocado em uma instituição do mercado de capitais, conforme os critérios de elegibilidade e retorno que eles têm. Então, a gente usa AI também para fazer essa otimização desses processos.
Nós conectamos todos os players. Não tiramos nenhum player da cadeia do relacionamento financeiro com o cliente. Eles ainda está lá, só que agora podendo avaliaar melhor se vai querer colocar o balanço dele no risco ou se ele vai querer tomar isso com outro agente financeiro. Estamos garantindo que ele conseguirá ter uma visão um pouco mais justa sobre o que ele está precisando.
Quando você não tem dado na análise de risco de crédito, ela tenta ser muito enviesada em relacionamento, o que é perigoso para as empresas e é perigoso para o produtor. Para esse risco ser melhor entendido e não meramente temido, tentamos colocar sempre no contexto do que está acontecendo no mercado.
Essa inteligência que a gente usa ajuda uma melhor seleção e uma melhor alocação de dinheiro. Nossa informação é basicamente um trace hability da qualificação desse risco e desse crédito. É muito difícil para o investidor que está milhões de quilômetros numa fazenda no Mato Grosso ou no Rio Grande do Sul, ter esse discernimento, essa noção.
A Traive ajuda a motivar mais e melhores investidores, o que ajuda os produtores a ter menor taxa.
Alimentos não podem ser caros. O que as pessoas não entendem é que produzir alimento e a logística do alimento são processos extremamente caros e cheios de risco.
Muito desse risco financeiro é do produtor, que transfere para a indústria, que vai para trading, que vai para a indústria de alimentos, que vai para o supermercado e o consumidor está lá na última cadeia. Qualquer custo do dinheiro que a gente tire do administrativo, do operacional e outras variáveis, ajuda.
Obviamente que a Traive não resolverá todo o problema da fome mundial. É um sistema complexo. Mas o que a gente acredita é que, trazendo mais liquidez, trazendo mais dados, mais entendimento e percepção de risco, melhores investimentos serão gerados.
Por exemplo, a Traive fez o primeiro CRAs verde no mundo. Usamos a tecnologia para qualificar também produtores com práticas sustentáveis. Um varejista sentado lá no Reino Unido, que não entendia nada de agricultura brasileira, se sentiu confortável e teve dados o suficiente para falar ‘Ok, esse é um investimento que eu quero fazer em agricultura sustentável.’
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