The Shift

Como será a transmissão esportiva do futuro

A transmissão esportiva está em processo de mudança intensa no Brasil e no mundo. A fragmentação deste mercado fica em evidência no futebol, esporte mais popular do país. Se há uma década os direitos de transmissão dos jogos estavam restritos a poucos canais de televisão, hoje temos plataformas de streaming proprietárias (Conmebol TV, Nordeste FC), startups (DAZN, OneFootball) e redes sociais (Facebook, TikTok) entrando no jogo.

Não se trata de apenas replicar o modelo televisivo nos meios digitais. A mudança de comportamento de consumo das novas gerações obriga o mercado a repensar estratégias de engajamento. De acordo com estudo da Deloitte, 25% dos fãs de esporte têm como prioridade experiências personalizadas para assistir às partidas. Além disso, mais de 40% dos fãs apreciam estatísticas de realidade aumentada (AR) em tempo real, e mais de 54% dos respondentes afirmam que teriam mais chance de assistir a jogos com imersão em realidade virtual (VR).

O vídeo acima apresenta uma possibilidade do que será uma transmissão esportiva no futuro, com aplicação de IA, realidade aumentada e interatividade total. Para patrocinadores e sites de apostas, este modelo cria possibilidades de integração muito além do que é feito hoje, com QR Codes e incentivo ao comportamento “multitela”.

Uma análise da McKinsey, novos produtos digitais, incluindo serviços para eventos transmitidos ao vivo, destaques, comentários de fãs, pontos de interatividade, notícias e análises, devem “ser projetados para novos comportamentos digitais que atravessam gerações”. Nesse sentido, a consultoria destaca:

Geração Z e o consumo de esportes

A noção de que as novas gerações têm um tempo menor de atenção do que as anteriores já vem sendo tratada como mito pela comunidade científica. Ainda assim, não se descarta que a Geração Z apresenta mais comportamento multitarefa e tem muito mais estímulos disputando a sua atenção. Esses fatores levam a um questionamento do modelo tradicional de transmissão esportiva.

O gráfico acima mostra como, nos EUA, pessoas mais jovens tendem a não assistir aos jogos completos, especialmente antes das fases decisivas dos torneios. Este grupo também prefere vídeos de melhores momentos do que as gerações anteriores.

Para Rodrigo Capelo, jornalista do Globo Esporte, não é uma questão de dificuldade de prestar atenção, mas de falta de vontade. “Não acredito na convenção de que a geração Z não consegue prestar atenção nas coisas por um determinado tempo. Ela não quer prestar atenção naquilo que as gerações anteriores julgavam ser interessante, como uma partida de futebol de 90 minutos ou um jogo de futebol americano de três horas”, opina durante o podcast Dinheiro em Jogo.

Capelo debateu com Rodrigo Kotscho, VP de comunicação do Orlando City, clube de futebol nos EUA, sobre o engajamento das novas gerações com os esportes. Na visão de Kotscho, é preciso ampliar o espectro do que é um potencial fã de esporte. “Muitas vezes estamos focados naquele fã que é fanático, que vai no estádio, que comenta nas redes sociais. Mas quem compõe a maior parte da base de consumidores são os torcedores casuais. Conseguir engajar e fazer ações para este público é muito importante”, diz.

Plataformas e modelos de negócio

A indústria de transmissão de esportes busca agora modelos de negócio, parcerias, novas plataformas e inovações que atraiam e retenham as novas gerações. O exemplo da DAZN mostra como nem sempre uma solução que funciona em um mercado pode ser replicável para todos os outros. A plataforma digital é líder na Europa, mas teve uma história curta e sem sucesso no mercado brasileiro.

Segundo Lucas von Cranach, fundador do aplicativo OneFootball, não é possível afirmar que o modelo de negócio, baseado em assinatura mensal, foi responsável pelo DAZN não funcionar por aqui. Em entrevista ao canal Máquina do Esporte, o alemão acredita que tudo faz parte de um processo semelhante ao que ocorreu na indústria da música.

“Não acredito que o torcedor exija o conteúdo de graça. O desafio é saber como ajustar o produto para a demanda do mercado e entender o valor que é cobrado pelos direitos. É algo muito similar à indústria da música. Há 20, 15 anos atrás, a indústria da música tinha um desafio de tornar a música acessível para o público. Ela era muito cara! Todo mundo foi para a pirataria, até que o Spotify veio com uma proposta em que a pessoa pagava o preço de um CD para ter todas as músicas possíveis com uma experiência incrível. E isso acabou com a pirataria”, diz o empreendedor.

Ao mesmo tempo, Von Cranach acredita que a transmissão do jogo em si é apenas uma parte da construção de uma plataforma de sucesso. ”Você chega em nosso produto não pelo evento ao vivo, mas porque nós servimos conteúdo em português sobre o seu time, e você pode acompanhar tudo sobre ele. Temos análise pré-jogo, clipes com melhores momentos, conteúdo em vídeo, resultados ao vivo”, revela. Hoje, a OneFootball transmite o Campeonato Francês e o Campeonato Alemão de forma gratuita para 11 milhões de usuários brasileiros.

Um modelo possível é a parceria com plataformas que já contam com tecnologia e expertise para oferecer vídeos ao vivo a milhões de usuários simultâneos. É o caso, por exemplo, da parceria entre a Copa do Nordeste e o TikTok.

Nesse sentido, vale destacar o potencial do Twitch, plataforma que conquistou as novas gerações com transmissões de games e competições de e-Sports. A empresa, que pertence à Amazon, lançou sua categoria de esportes em julho de 2020 e já firmou colaborações com clubes como Real Madrid, Juventus, Paris Saint Germain e Arsenal para fornecer conteúdo exclusivo.