Fazer conteúdo viral é mais ciência comportamental do que sorte. Com base em anos de pesquisa em Ciências Sociais e testes com executivos de Marketing, o professor David Dubois, do INSEAD, desenvolveu um framework para ampliar o alcance orgânico nas redes sociais. Batizado de SPREAD, ele reúne seis elementos: Utilidade Social (Social Utility), Provocador, Replicável, Emocional, Ambíguo e Distribuível.
A seguir, veja o que significa cada elemento – e como as marcas estão aplicando (ou falhando em aplicar) esse modelo.
S – Utilidade Social e Sensibilidade (Social utility and sensitivity)
No mundo atual, viralidade começa por relevância social. As campanhas que realmente conectam não apenas entretêm – elas ajudam as pessoas a expressarem valores, fortalecerem laços e se sentirem parte de algo maior.
Exemplo: a Duolingo, com sua coruja irreverente, usou a plataforma do TikTok para promover a equidade linguística, alcançando 800 milhões de visualizações e um aumento de 54% nos downloads do app em um ano. Já a Dove, com a campanha “Cost of Beauty”, discutiu os efeitos das redes sociais na saúde mental de jovens, alcançando 6,6 bilhões de impressões e aumento de 5,5% nas vendas nos EUA.
Pergunte-se:
- O conteúdo oferece valor ou significado para quem o compartilha (por exemplo, ajudando-o a sinalizar seus valores para outras pessoas ou fortalecendo laços sociais entre o compartilhador e seu público)?
- É um conteúdo que as pessoas se sentirão bem em compartilhar e que amplifica valores como empatia ou identidade pessoal?
- Compartilhar esse conteúdo refletirá positivamente no relacionamento do remetente com os destinatários (seguidores existentes e novos espectadores)?
- Este conteúdo ignora ou trivializa as sensibilidades sociais atuais?
P – Provocação com propósito (Provocative)
Ser provocador pode ser uma arma poderosa – mas deve vir com contexto e propósito. Campanhas que desafiam o status quo ou trazem dados surpreendentes mobilizam a audiência.
Exemplo: em 2024, a Elf Beauty viralizou ao mostrar que havia mais homens chamados Dick do que mulheres em conselhos corporativos nos EUA. A campanha “So Many Dicks” gerou 2,3 bilhões de impressões e aumentou o reconhecimento da marca em 20%. Por outro lado, Apple e Pepsi enfrentaram reações negativas quando tentaram provocar sem sensibilidade cultural – trivializando temas como protestos ou criatividade, o que custou caro à reputação das marcas.
Evite: se posicionar como “herói” de causas sem dar voz às pessoas afetadas ou simplificar problemas complexos.
Pergunte-se:
- Este conteúdo desafia normas ou desperta curiosidade?
- Quão surpreendente ou contraintuitivo é o formato ou a mensagem do conteúdo?
- Este conteúdo provoca de uma forma que possa ser interpretada como insensível ou ofensiva? Por exemplo, simplifica demais questões complexas? Oferece a marca como uma solução rápida para problemas sistêmicos? Caracteriza-se como um herói (em vez de amplificar vozes afetadas)?
- Adota um tom prescritivo, dizendo às pessoas o que elas devem fazer?
R – Replicável e participativo (Replicable)
Conteúdos que convidam à participação – como desafios, memes e versões personalizadas – têm muito mais chances de ganhar tração. Isso porque dão ao público um papel ativo, estimulando apropriação e cocriação.
Exemplo: A campanha “Draw Ketchup”, da Heinz, por exemplo, gerou US$ 5,8 milhões em mídia espontânea e fez suas embalagens de edição limitada esgotarem em horas. Outro exemplo é a tendência do “Império Romano” no TikTok, que resultou em 2,1 bilhões de views e mais de 12 mil remixes de marcas como Netflix e Domino’s.
Dica: conteúdo replicável não precisa ser complexo – precisa ser fácil de reinterpretar e “brincar”.
Pergunte-se:
- Quão fácil seria para alguém copiar, remixar ou responder a este conteúdo?
- Este conteúdo desperta o interesse dos usuários e a vontade de criar sua própria versão (por exemplo, incentivando ativamente memes, remixes, duetos ou desafios)?
- O conteúdo é muito complexo ou refinado para inspirar a participação dos usuários?
E – Emocionalmente ressonante (Emotional)
Emoções geram mais compartilhamento. Mas no ambiente atual, o que importa não é só a intensidade emocional, mas a relevância da emoção para a mensagem e para o público.
Exemplo: a campanha “Made Possible by Hosts” do Airbnb, ao mostrar reconexões emocionantes pós-pandemia, fez a marca atingir seu maior lucro da história: US$ 834 milhões em um trimestre, crescimento de 280% em relação ao ano anterior. Já a Peloton foi criticada pela campanha natalina em que um marido presenteava a esposa com uma bicicleta de spinning. A intenção era boa; o impacto, desastroso – a percepção pública foi de sexismo.
Pergunte-se:
- Este conteúdo evoca uma forte resposta emocional (por exemplo, alegria, tristeza, admiração)?
- A emoção evocada parece relevante e alinhada ao produto anunciado ou ao objetivo da campanha?
A – Ambiguidade que gera conversa (Ambiguous)
Ambiguidade pode ser um motor de viralização quando estimula interpretação, curiosidade e debate. Em vez de entregar tudo pronto, ela convida o público a decifrar, completar e compartilhar sua visão.
Exemplo: a Lego, com a campanha “Rebuild the World”, usou cenas surreais que deixaram margem para interpretação – resultando em aumento de 14% na receita. Já a marca indiana Wrogn mobilizou 42 milhões de impressões em um dia ao postar imagens misteriosas com #IYKYK (“If You Know, You Know”).
Boa ambiguidade: gera discussão criativa e envolvimento.
Má ambiguidade: confunde sem provocar engajamento.
Pergunte-se:
- Este conteúdo deixa espaço para diferentes interpretações ou significados pessoais?
- Partes do conteúdo despertam curiosidade ou deixam perguntas sem resposta?
- Qual a probabilidade de as pessoas discutirem ou debaterem o real significado deste conteúdo?
D – Distribuível em várias plataformas e formatos (Distributive)
Por fim, a viralidade depende da capacidade do conteúdo circular com fluidez. Isso significa adaptar o formato para que ele funcione bem em TikTok, Instagram, WhatsApp, Reddit – e incentive as pessoas a replicar, marcar amigos ou remixar.
Exemplo: campanhas como o #DollyPartonChallenge e o #ShareYourEars da Disney se espalharam porque usavam estruturas simples, reconhecíveis e que convidavam o público a entrar na brincadeira. O sucesso de marketing do filme “Barbie” também se deveu em parte ao criador de pôsteres com IA – que gerou 4 milhões de imagens de usuários em um mês, impulsionando o fenômeno “Barbenheimer”.
Pergunte-se:
- O formato facilita o compartilhamento – por exemplo, oferecendo instruções claras (como “Marque um amigo que…”), modelos fáceis de copiar, linguagem específica para a campanha (como hashtags) ou recursos nativos da plataforma, como repostagens com um clique ou integrações com adesivos?
- É fácil imaginar as pessoas compartilhando ou amplificando esse conteúdo em diferentes canais?
- A mensagem incentiva ativamente os destinatários a compartilhar o conteúdo com outras pessoas (por exemplo, via Instagram ou TikTok)?