The Shift

Transformação digital com tempero local

Alexandre Telles, diretor de tecnologia, digital e procurement da Ajinomoto Brasil

A Ajinomoto do Brasil está provando que projetos globais de inovação também podem ter tempero local. A subsidiária brasileira da gigante japonesa — referência em aminoácidos e detentora de marcas como SAZÓN®, MID® e VONO® — desenvolveu a plataforma EIA (Ecosystem Integration Ajinomoto), uma iniciativa que reorganiza toda a cadeia de valor da empresa em um ecossistema digital integrado, mirando garantir que as metas de DX até 2030 aconteçam com tecnologia, negócios e pessoas.

Mais do que automatizar processos, a EIA nasce como projeto brasileiro dentro de uma estratégia global de transformação digital (DX). “A EIA é um ecossistema integrador. O que ela faz é harmonizar processos, dados e pessoas para criar valor econômico e social real”, diz Alexandre Telles, diretor de tecnologia, digital e procurement da Ajinomoto Brasil. A plataforma abrange áreas como produção, logística, vendas, atendimento ao cliente, P&D e supply chain, e já se tornou um modelo de referência para as demais unidades da companhia na América Latina.

A plataforma também é, segundo Alexandre, um case de “DX com propósito”: integra IA, automação e dados em larga escala, mas também está profundamente alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, reforçando o compromisso da Ajinomoto em unir eficiência, inovação e impacto positivo na sociedade.

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Alexandre Telles tem uma carreira de mais de 30 anos na Ajinomoto, atuando no Brasil e no Japão. Nesse novo cargo há quatro meses, ele detalha nessa entrevista como a empresa está redesenhando sua cultura, estrutura e propósito para impulsionar a transformação digital — com tempero brasileiro. A seguir, você lê a entrevista completa.

Da excelência operacional ao DX: como nasce a plataforma EIA

Como surgiu a plataforma EIA dentro da Ajinomoto e qual o papel dela na jornada global de transformação digital da companhia?

“A transformação digital da Ajinomoto começou em 2016, baseada em nosso DNA de excelência operacional, muito influenciado pela cultura japonesa. Naquele momento, o foco era otimizar processos e energia nas fábricas. Em 2020, veio o DX global (Digital Transformation), lançado pela matriz, e nós aderimos com força total.

Em 2023, criamos a plataforma EIA (Ecosystem Integration Ajinomoto), que conecta todas as cadeias de valor da empresa — das unidades fabris às áreas comerciais e corporativas. Ela não é uma tecnologia, mas um ecossistema integrador, com pilares de educação e empoderamento, automação e excelência operacional.

A EIA surgiu como resposta à necessidade de orquestrar processos e informações, reduzindo silos e criando um ambiente colaborativo que favorece a inovação. Esse projeto brasileiro acabou ganhando visibilidade dentro do grupo global justamente por conseguir estruturar de forma prática o que o programa DX prega conceitualmente: transformar dados e processos em decisões mais inteligentes e sustentáveis.

O modelo da plataforma nos permite ajustar rapidamente o foco conforme os objetivos estratégicos mudam. Se a prioridade passa a ser aumentar vendas ou reduzir custos, conseguimos redirecionar esforços e recursos com mais agilidade.”

Um ecossistema que integra dentro e fora da empresa

A EIA foi desenhada para integrar tanto o ambiente interno quanto o externo. Como funciona essa lógica de conexão e quais são os resultados esperados?

“O grande objetivo é romper os silos e criar pontes com o ecossistema externo — fornecedores, clientes e parceiros. A plataforma conecta dados de múltiplas fontes e permite cocriação de valor com toda a cadeia. Isso inclui redes sociais, e-commerce e outras fontes externas, para gerar insights que alimentem os próximos estágios da transformação digital.

Trabalhamos com quatro estágios de maturidade:

  1. Transformar o ecossistema interno;
  2. Integrar cadeias de valor;
  3. Transformar o modelo de negócio (DX 3.0);
  4. Transformar a sociedade (DX 4.0).

Hoje já temos boa maturidade nos dois primeiros níveis. No 1.0 e 2.0, temos, por exemplo, a digitalização do supply chain. Antes, usávamos muitos controles manuais, planilhas e trocas de informações por canais dispersos — e-mails, chats, WhatsApp. Isso gerava ineficiência. Agora, com o DX 2.0, centralizamos e automatizamos essas operações.

Estamos avançando para o 3.0, com foco em novos negócios e impacto social. O 4.0 é o nosso horizonte até 2030 — o momento em que a tecnologia deixa de ser fim e se torna meio para gerar valor econômico e social sustentável.”

Cultura, educação e o papel da IA na mudança organizacional

Você mencionou a importância da educação. De que forma o letramento digital e a IA entram nessa jornada de mudança cultural?

“Transformação digital é, antes de tudo, transformação de pessoas. Nosso primeiro passo foi educar e conscientizar sobre o uso da tecnologia como habilitadora de novos negócios.

A Inteligência Artificial tem papel central nisso. Já usamos Machine Learning e Deep Learning em várias frentes:

Mas nosso foco agora é disseminar a IA generativa, com um projeto global chamado AGI-AI, uma solução encapsulada e segura, inspirada no ChatGPT. Ela funciona como plataforma educacional, incentivando os colaboradores a aprender a criar prompts e experimentar.

Estamos construindo uma cultura onde todos possam usar a IA de forma prática e responsável — não apenas como modismo, mas como ferramenta de aprendizado, produtividade e inovação. Ainda não estamos aplicando a IA generativa para resolver problemas de negócio diretamente. O objetivo inicial é criar familiaridade e confiança no uso da ferramenta.”

Governança, indicadores e tecnologias habilitadoras

Como vocês mensuram o sucesso da transformação digital e quais tecnologias sustentam essa jornada?

“Desde 2017, trabalhamos com business cases vivos, ajustados conforme evoluem a estratégia e o mercado. Hoje, medimos retorno financeiro com bastante rigor, mas estamos expandindo para cinco pilares:

  1. Aumento de vendas
  2. Redução de custos
  3. Expansão de negócios (produtos e serviços)
  4. Eficiência e produtividade
  5. Redução de riscos

Esses critérios orientam a priorização de projetos e ajudam a alinhar as iniciativas de transformação com as metas estratégicas do negócio, facilitando a priorização e a conversa com o board e evitando decisões isoladas por silos. Estamos também estruturando a governança de dados via Data Lake, reduzindo redundâncias e aumentando a eficiência na tomada de decisão.

A EIA é o habilitador da integração. Nosso desafio é orquestrar, e não centralizar. O antigo conceito de Shadow IT se pulverizou — hoje todos fazem IA, mas é preciso orquestrar sem bloquear. Esse é o papel da plataforma.

Entre as tecnologias habilitadoras estão a IA (com GPT interno), Digital Twins aplicados à manufatura e soluções de automação avançada. Além disso, temos um compromisso global com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Isso inclui iniciativas concretas de redução do consumo de dados e CO₂, como programas de data cleanup que diminuem o uso de servidores e otimizam o armazenamento em nuvem.”

TI como parceiro de negócio e visão para 2030

A EIA nasceu da organização, mas a TI tem um papel central nessa orquestração. Como isso reposiciona a área de tecnologia e qual é a visão de futuro até 2030?

“A TI deixou de ser área de suporte e passou a atuar como parceira estratégica do negócio. Criamos um modelo de business partners, com profissionais de tecnologia integrados nas áreas operacionais para entender o negócio e falar sua linguagem.

Atualmente, eu me reporto ao COO da Ajinomoto, que integra o board e responde diretamente ao CEO. Isso assegura que a tecnologia esteja conectada à estratégia operacional e corporativa.

Nosso desafio é garantir que a transformação digital avance de forma transversal, eliminando silos e fortalecendo a colaboração. O board já reconhece a tecnologia como investimento e ativo de decisão estratégica, o que acelera a inovação.

Até 2030, queremos atingir o DX 4.0, em que a Ajinomoto não apenas transforma seus negócios, mas também contribui ativamente para a transformação da sociedade, com novos produtos, serviços e processos sustentáveis. A plataforma EIA é o motor dessa jornada — feita no Brasil, mas com impacto global.”