Quando ainda era CEO da AWS (agora é CEO e presidente da Amazon), Andy Jassy explicou o sucesso da empresa de nuvem pública sobre as concorrentes com uma frase que virou sua marca; “não existe algoritmo de compressão para a experiência“. A explicação é que a empresa, fundada em 2006, tinha anos de vantagem construídos internamente e, depois de virar companhia de nuvem, uma enorme curva de aprendizado de mercado, na qual aplicava a máxima da companhia-mãe: obsessão pelo cliente.
Essa obsessão pelo cliente, e a frase de Andy Jassy, fazem parte da conversa com Cleber Morais, Diretor Geral para Setor Corporativo da AWS no Brasil, para falar dos 10 anos da companhia no país, completados este ano. “Hoje as empresas não pensam se vão entrar na nuvem: só decidem como e quando”, diz Morais, ao avaliar a evolução do mercado local e do próprio cenário de transformação digital. “Agora a gente tem clientes de A a Z, desde pequenas startups, que gastam centenas de dólares, até alguns clientes que gastam milhões. Vários desses clientes têm consciência de que estão em uma jornada e ela é muito individualizada, não tem uma receita única que possa ser replicada. Ela tem um aspecto tecnológico, ela tem um aspecto cultural, tem processos, por isso é que a gente precisa ter um modelo de cobertura muito próximo do cliente”, explica.
10 anos de AWS no Brasil
“Acho que esses 10 anos de Brasil mostram muito da nossa visão e capacidade de antecipar cenários. Há dez anos, olhando a região da América do Sul, resolvemos fazer investimentos em infraestrutura de cloud, que são investimentos pesados, criando uma região com clusters de data center para prover baixa latência e alta disponibilidade. A gente investiu aqui antes de investir no Canadá e no Japão, preparando uma visão de longo prazo.
Acho que os primeiros clientes que abraçaram o conceito da nuvem foram ou clientes que tinham forte espírito de pioneirismo, entendendo todos os benefícios da nuvem, ou startups que, pelo fato de não ter que fazer um grande investimento, e infraestrutura, podiam aderir a um modelo mais ágil com custo flexível conforme o crescimento do negócio. Especificamente no Brasil, a gente conseguiu criar uma arquitetura de startups que hoje é uma referência. A gente tem orgulho de dizer que hoje o Nubank, a Gympass, a Hotmart, que nasceram dentro desse modelo, estão ganhando ares globais.
Essas empresas começaram a ganhar musculatura, digamos assim, e começaram a pressionar as empresas tradicionais porque conseguiam levar mais produtos e mais agilidade ao mercado. Em algum momento, há alguns anos, você começa a ver as grandes empresas seguirem essa jornada. E aí você vê não só os bancos, que foram talvez os que reagiram mais rápido. Mais recentemente teve o empurrão da pandemia. Os clientes tiveram que transformar os seus negócios, mudar a forma de se comunicar. Não é mais se o cliente vai para a nuvem, mas é quando e como. Agora a gente tem clientes de A a Z, desde pequenas startups, que gastam centenas de dólares, até alguns clientes que gastam milhões.”
Nuvem e pandemia
“Talvez durante a pandemia a nuvem tenha a florescido com relação a todos os benefícios que ela traz. A gente fez um trabalho de otimização com clientes que utilizavam a infraestrutura de nuvem, especialmente de custo. Foram mais de 600 clientes com quem a gente trabalhou em relatórios de como poderiam diminuir os custos, que foram fundamentais no primeiro momento para vários clientes que tiveram que fechar lojas físicas, por exemplo. Por outro lado, para aqueles que não tinham como abrir a loja e não tinham como fazer uma reunião virtual, por exemplo, provemos tecnologia para que eles mudassem o mindset, e isso acelerou de maneira muito forte.
E outros que tiveram que inovar mesmo, porque viram que o modelo tradicional não funcionaria e que precisariam migrar para e-commerce, por exemplo, ajudando a fazer a mudança. Por último, tivemos os clientes com picos de demanda, como o iFood, que teve aumento de consumo gigantesco, a Netflix, as empresas de games. Aí exigiu uma aceleração da capacidade de atender a demanda. Conseguimos empregar uma mistura de estratégia com investimento e com visão – um ano antes da pandemia, a gente anunciou um investimento de US$ 1 bilhão no Brasil, que era para aumentar a infraestrutura de nuvem no país. As grandes empresas aceleraram a utilização, e os médios clientes começaram a entrar nessa jornada por várias questões, entre elas a segurança, já que para eles é um conforto usar os mesmos sistemas de segurança que uma grande empresa usa.”
Mais que infraestrutura
“A gente usa a expressão “não existe algoritmo de compressão para a experiência“. O nosso modelo é muito voltado à obsessão pelo cliente. Primeiro ele aparece na quantidade de serviços que oferecemos – mais de 230 serviços – mas depois, e é um fator fundamental, entra a nossa relação com o cliente, que é de construir e inovar junto. Hoje, quase 90% do que desenvolvemos fazemos a quatro mãos com os clientes. A gente tem uma linha de pesquisa e desenvolvimento que gera mais de 8 features ou inovações por dia.
Por exemplo, o Nubank estava tendo um grande desafio na abertura e autenticação de contas. Nós desenvolvemos com eles um aplicativo para reconhecimento facial que diminuiu significativamente o nível de fraude. Ou quando o Itaú, que é nosso cliente há dois anos, que tem um legado e que está fazendo a migração para a nuvem, precisa desenvolver algo na nossa tecnologia que conecte com o ambiente anterior deles. Esse tipo de interação acontece por conta da proximidade junto ao cliente e pelo fato de termos uma equipe que ajuda realmente no core do negócio. Isso faz a diferença e traz a liderança.
Um dos exemplos que eu gosto de citar, e que mais me encanta, é o projeto com a Coteminas para o travesseiro inteligente da Persono. Veja, a Coteminas é uma empresa centenária, uma indústria, pensando em inovar seu negócio. O Josué Alencar, diretor de tecnologia do grupo Coteminas, foi até Seattle para ter uma reunião conosco focada em inovação e cultura. A missão dele era dar mais qualidade de sono para os clientes. E aí fizemos um projeto baseado no nosso modelo de working backwards, que é trabalhar de trás para frente para chegar à inovação desejada. A Coteminas tem todo o processo fabril do travesseiro, da roupa de cama, mas a conexão com a gente veio da pergunta “como é que eu monitoro o sono e trago qualidade de vida melhor?“. A equipe foi para a China ver equipamentos de IoT para monitorar e fez o travesseiro-piloto. Quem dormiu com o travesseiro foi nossa equipe, que testou o produto.
Hoje é um produto que ele está vendendo e que consegue monitorar o sono coletando milhões de dados e retornando como qualidade de vida. Esse exemplo é fantástico porque tangencia tudo o que a gente faz. Desde inovar, começando com um investimento relativamente pequeno, até transformar um produto de uma indústria como a Coteminas. Eu gosto de usá-lo porque não se trata de uma startup, de uma empresa nativa digital. Isso tem acontecido com vários clientes da gente, como Boticário, Natura, Embraer…
A primeira provocação que a gente faz é no aspecto cultural, principalmente nas grandes empresas. “Como é que eu inovo? Como é que eu empodero meus funcionários para a tomada de risco?”. Para inovar, a gente provoca trazendo para eles a forma como pensamos. Não é o ideal para todas as empresas, mas pode trazer diferencial. Não é uma consultoria, mas é um trabalho conjunto de entender a necessidade do cliente e ajudá-lo na jornada digital.”
Para além da tecnologia
“As empresas já entenderam que o diferencial vem da agilidade delas de ir ao mercado e da inteligência de coletar os dados dos clientes. Tem processos por trás disso, tem conhecimento do cliente, tem toda essa questão de como se trabalha com dados e tem pessoas que abraçam a tecnologia e conseguem transformar o negócio das empresas e diminuir a dependência de coisas mais tradicionais para coisas que agregam valor para nós como clientes. Esse é um novo paradigma que está vindo. Vários desses clientes têm consciência de que estão em uma jornada e ela é muito individualizada, não tem uma receita única que eu consigo replicar em todas. Ela tem um aspecto tecnológico, ela tem um aspecto cultural, tem processos, por isso é que a gente precisa ter um modelo de cobertura muito próximo do cliente.”
Capacitação de pessoas
“Hoje, o grande desafio de alguns clientes para seguir na jornada da nuvem é a capacitação técnica. Existe uma briga de talentos por conta da escassez. A gente identificou isso já há algum tempo, e criamos programas que treinaram mais de 300 mil pessoas desde 2017.
Primeiro buscamos a proximidade com a academia. Temos um um programa para capacitar as universidades para poder treinar pessoas em tecnologia, treinar os professores para que eles sejam certificados e consigam levar essa capacitação para as universidades. Junto com a iniciativa privada, e aí é o outro lado, a fomentar a capacitação. Tem o exemplo com o iFood, que fez um programa de capacitação para mais de 3 mil pessoas. Olhamos o ecossistema dele como um todo, desde os entregadores até outras pessoas e, em grande parte, essas pessoas estão conseguindo emprego. Temos outras parcerias, como a parceria recente com o Boticário, para treinar o ecossistema da equipe de vendas. Fizemos uma parceria com a Accenture e com o Itaú da mesma forma.
Talvez a AWS possa ajudar a fazer um Brasil melhor. Na hora em que a gente capacita esse mercado – e globalmente o sonho são 29 milhões de pessoas até 2025 – e prepara melhor uma pessoa que está saindo da universidade, ela pode sonhar em ser empreendedora ou ter um emprego diferenciado, tanto no Brasil quanto globalmente, porque esse modelo remoto veio para ficar. Podemos ajudar pessoas a mudar de carreira – um arquiteto se capacitando em nuvem pode levá-lo a trabalhar no Quinto Andar, por exemplo. É uma visão completamente diferente.
A gente entende que isso pode ser um legado para o Brasil e eu diria que hoje é um dos principais focos da AWS: como a gente ajuda a fazer isso junto com nossos clientes. O Nubank soltou um programa de capacitação enorme internamente e também para o mercado. Por um lado resolve o gargalo que ele tem e por outro lado ajuda a colocar pessoas em um patamar diferente. O brasileiro por si é um tecnólogo, ele usa a tecnologia, ele abraça a tecnologia. Para nós é um propósito: ajudar essas empresas na transformação delas e ajudar as pessoas a contribuírem com isso.
Eu vejo que dentro dessa história de 10 anos a contribuição da AWS foi bem intensa para o Brasil. A gente olha a transformação dos clientes, a renovação dos negócios, e falamos através deles. No nosso estilo “Day One”, sabemos que tem sempre novas transformações que estão vindo, mas hoje celebramos multinacionais brasileiras digitais que surgiram a partir da nuvem e isso dá orgulho. A nuvem foi o grande habilitador de tudo isso, e dá orgulho ver empresas como Nubank, VTEX e Hotmart ganhando o mundo, por exemplo.”