A simulação por IA com agentes autônomos é uma tendência real e em crescimento. E já começa a revolucionar a tomada de decisões, fornecendo insights em tempo real sobre o comportamento do consumidor. Empresas líderes já testam e implementam; muitas continuam em piloto. Podemos dizer que a simulação por IA com agentes autônomos está para a tomada de decisão hoje como o Machine Learning estava em 2015: em aceleração, com alta expectativa e primeiros resultados sólidos, mas difícil de implementar.
Em sua essência, a simulação por IA refere-se ao uso de algoritmos e modelos de IA para replicar o comportamento de sistemas, ambientes ou entidades em um ambiente digital controlado. Ao contrário das simulações tradicionais, que se baseiam puramente em modelos matemáticos e regras predeterminadas, as simulações de IA utilizam aprendizado de máquina, redes neurais e outras técnicas de IA para criar modelos mais dinâmicos, adaptáveis e realistas.
Assim chegamos às simulações por IA baseadas em agentes sintéticos autônomos que pensam, decidem e agem como indivíduos, grupos ou entidades. Elas permitem que lideranças de negócio testem possibilidades, prevejam resultados e reimaginem o futuro, antes que ele aconteça, modelando padrões comportamentais, preferências e compensações em populações sintéticas.
Entre as vantagens estão a possibilidade de:
- Testar centenas de cenários de mercado antes de investir recursos
- Prever comportamento de consumidores e investidores
- Otimizar cadeias de suprimentos e processos produtivos
- Antecipar perda de clientes e intervir proativamente
- Transformar o planejamento estratégico de ciclos anuais para adaptação contínua
Embora não garantam o que as pessoas farão, as simulações baseadas em agentes fornecem uma visão mais estruturada de como as pessoas provavelmente agirão em novos cenários, fomentando o brainstorming e inovação, simulando resultados de diferentes estratégias para a empresa.
Não por acaso, os setores que mais vêm experimentando simulação com agentes autônomos em 2025 são saúde, varejo, logística e transporte e finanças.
Varejo
- Personalização da experiência do cliente: agentes autônomos simulam o comportamento de consumidores para desenvolver campanhas de marketing hiper personalizadas e otimizar recomendações de produtos.
- Gestão de estoques e logística: simulações ajudam a prever demandas, gerenciar inventários e otimizar rotas de entrega, reduzindo custos e aumentando a eficiência operacional.
Saúde
- Modelagem de processos hospitalares e farmacêuticos: agentes autônomos são usados para simular fluxos hospitalares e processos de produção de medicamentos, melhorando a eficiência e controle de qualidade.
- Treinamento e suporte à decisão clínica: simulações com agentes auxiliam médicos na tomada de decisões complexas e no treinamento de equipes médicas com cenários virtuais.
Finanças
- Modelagem de comportamentos de investidores: agentes autônomos simulam estratégias de investidores e movimentos do mercado para prever tendências econômicas e otimizar decisões de compra e venda.
- Gerenciamento de risco e compliance: Utilizam-se simulações para testar a robustez de estratégias financeiras sob diferentes cenários de mercado, auxiliando na gestão de riscos.
Indústria e manufatura
- Otimização da produção: agentes autônomos simulam linhas de produção, identificando gargalos e testando melhorias de fluxo de trabalho antes da implementação real.
- Manutenção preditiva: modelos simulam falhas em máquinas com base no comportamento de agentes que representam componentes de equipamentos industriais, otimizando a manutenção preditiva.
Logística e transporte
- Otimização de rotas e gestão de frotas: agentes autônomos simulam rotas para reduzir custos, melhorar tempos de entrega e responder a imprevistos em tempo real.
Setor de energia
- Gestão de redes elétricas inteligentes: simulações com agentes otimizam o fluxo de energia, prevendo picos de demanda e ajustando o fornecimento de forma eficaz.
Recentemente, a EY decidiu realizar um teste pioneiro de validação do valor estratégico da simulação por IA baseada em agentes. A empresa desafiou a startup Aaru a recriar o seu “Relatório de Pesquisa Global de Riqueza”, de 2025 , uma das iniciativas de pesquisa mais abrangentes do setor, que abrange 3.600 investidores de alta renda em mais de 30 mercados.
O trabalho de campo tradicional costuma levar seis meses. Em um dia, apenas, os resultados da pesquisa simulada apresentaram uma correlação de mais de 90% com a pesquisa real — um parâmetro impressionante para qualquer modelo preditivo.
Mais importante ainda, nas áreas onde as previsões da Aaru divergiram das respostas da pesquisa, a simulação de IA se mostrou mais precisa na previsão do comportamento no mundo real. Conforme explicaram analistas da EY:
“A ciência comportamental demonstra que as pessoas exibem vieses sistemáticos ao prever seu próprio comportamento em cenários hipotéticos. É sabido que, em estudos de mercado, os respondentes tendem a fornecer respostas socialmente mais aceitáveis em vez de suas opiniões verdadeiras, um fenômeno conhecido como viés de desejabilidade social. Fatores como fadiga, falta de atenção ou a intenção de agradar o pesquisador podem levar a distorções.”
A pesquisa tradicional capturou o que os investidores disseram que fariam (intenções declaradas). A simulação modelou o que eles provavelmente fariam (comportamento real), eliminando:
- Viés de desejabilidade social: investidores dando respostas que parecem mais sofisticadas ou responsáveis
- Viés hipotético: a dificuldade das pessoas em prever com precisão seu próprio comportamento futuro
- Fadiga de pesquisa: respostas automáticas sem reflexão profunda
A modelagem comportamental por simulação de IA elimina esses vieses, acelera a pesquisa e fornece insights superiores ao modelar o comportamento real em vez de intenções declaradas. Insights esses que permitem aos gestores de patrimônio:
- Antecipar quais clientes trocarão realmente de provedor (não somente os que dizem que vão)
- Desenvolver estratégias baseadas em comportamento real, não em intenções
- Reduzir drasticamente o tempo de pesquisa de mercado de meses para dias
- Testar novas ofertas de serviços em populações sintéticas antes do lançamento
Mas há desafios. Entre eles:
- Dependência de dados de boa qualidade, ainda que sintéticos e de modelagem que reflita adequadamente o ambiente real: agentes “mal projetados” ou regras mal calibradas podem levar a resultados enganadores.
- Validação, governança e auditoria ainda são áreas críticas. ABMs sofrem historicamente com a forma como se verificam e validam os resultados.
- Escalabilidade e custo: simular muitos agentes com comportamentos complexos pode exigir recursos computacionais relevantes.
- Interpretação e ação: mesmo com bons resultados, ainda cabe aos gestores interpretar o output da simulação e traduzir para decisão — não é “automático”.
- Risco de sobre-confiança: simulações oferecem cenários, não garantias.
Outra evidência recente confirma o salto de desempenho. Um estudo de 2025, “Scalable, Symbiotic, AI and Non-AI Agent-Based Parallel Discrete Event Simulations”, mostrou que a integração de agentes inteligentes e não inteligentes em simulações paralelas elevou a acurácia média para cerca de 68%, frente a menos de 23% obtidos por modelos tradicionais.
A pesquisa demonstra que, ao combinar algoritmos de aprendizado com agentes autônomos, as simulações tornam-se mais realistas e escaláveis, superando a limitação dos modelos determinísticos. Isso valida o uso de agentes de IA como núcleo ativo de simulações empresariais.
A comparação com as abordagens tradicionais é gritante. A tomada de decisões do século XX baseia-se em dados históricos para extrapolar tendências. A simulação por IA oferece uma alternativa para o século XXI: criar mercados digitais, testar cenários e observar os resultados antes de tomar qualquer decisão.
Não se trata de uma melhoria incremental. É uma transformação fundamental na forma como as organizações tomam decisões.
Implicações lideranças
A adoção de simulações baseadas em agentes é uma mudança estratégica que impacta governança, infraestrutura e processos decisórios. Para que essa transformação gere valor real, as lideranças precisam considerar aspectos críticos de implementação e gestão. Entre eles:
- Estratégia e planejamento: simulações com agentes autônomos permitem que a liderança teste múltiplos futuros (“E se …”) em ambientes controlados, antes de comprometer capital ou mudar curso operacional.
- Governança de modelos: implementar esse tipo de simulação exige que se tenha políticas claras sobre: quem define os agentes, quais dados alimentam os modelos, como monitorar viés, como auditar os resultados e fechar o loop de feedback para ajustes reais.
- Dados e infraestrutura: para que essas simulações sejam confiáveis, é necessário que os dados de entrada sejam consistentes, bem governados, e que a infraestrutura suporte execução em escala (servidores, nuvem, integração com gêmeos digitais, etc).
- ROI e métricas: antes da adoção, é estratégico definir indicadores de sucesso: ex., tempo economizado, erros evitados, aumento de acurácia em previsão de demanda, melhoria operacional. Sem isso, fica difícil justificar investimento.
- Integração com a operação real: a simulação deve alimentar decisão real e ser parte do ciclo de “planejar-simular-executar-aprender”. Não basta ter a simulação isolada.
- Risco e compliance: em ambientes regulados (saúde, finanças, energia) é necessário garantir que a simulação e os agentes autônomos não violem normativas de privacidade, explicabilidade, auditoria e que estejam alinhados com frameworks de risco de IA (ex: TRiSM).
Um caso real
Curiosamente, uma das áreas mais beneficiadas por simulações baseadas em agentes autônomos é a do desenvolvimento de agentes autônomos, que estão cada vez mais mediando decisões econômicas, desde
a descoberta de produtos até transações, em nome dos usuários. Essas aplicações prometem benefícios, mas também levantam muitas questões sobre a responsabilidade dos agentes e o valor para os usuários.
Responder a essas questões exige compreender como os agentes se comportam em condições de mercado realistas. No entanto, pesquisas anteriores avaliaram agentes principalmente em ambientes restritos, como mercados de tarefa única (por exemplo, negociação) ou interações estruturadas entre dois agentes. Os mercados do mundo real são fundamentalmente diferentes: eles exigem que os agentes lidem com diversas atividades econômicas e se coordenem dentro de ecossistemas grandes e dinâmicos, onde múltiplos agentes com comportamentos opacos podem se envolver em diálogos abertos.
Para preencher essa lacuna, pesquisadores da Microsoft investigaram mercados com agentes de dois lados, onde agentes Assistentes representam consumidores e agentes de Serviço representam empresas concorrentes, em interações no Magentic Marketplace – um ambiente simulado onde Assistentes e Serviços podem operar. Esse ambiente permite estudar dinâmicas-chave do mercado: a utilidade que os agentes alcançam, vieses comportamentais, vulnerabilidade à manipulação e como os mecanismos de busca moldam os resultados do mercado.
O experimento mostrou comportamentos em diferentes condições de mercado, fornecendo informações importantes para o desenvolvimento de mercados agentes justos e eficientes.