O mundo está cheio de mudanças repentinas que podem ser difíceis de prever com antecedência. Ecossistemas, redes elétricas e organismos vivos são todos sistemas complexos que podem experimentar mudanças de regime, onde um parâmetro global (como populações de espécies ou produção de eletricidade) muda abruptamente de valor. Essas mudanças, também chamadas de pontos de inflexão ou transições críticas, podem ocorrer mesmo quando o ambiente ao redor é relativamente estável. Hoje, a pesquisa sobre essas mudanças de regime usa ferramentas da física estatística e teoria de sistemas dinâmicos, entre outras técnicas, para analisar dados observacionais e antecipar mudanças repentinas antes que ocorram.
Nas últimas duas décadas, a análise de dados de ecologia, epidemiologia e outros campos identificou vários marcadores estatísticos que anteciparam mudanças abruptas antes que elas ocorressem. A variância da amostra e a autocorrelação lag-1 (a correlação entre pontos de dados tomados com um período de tempo de intervalo) das séries temporais de dados de observação, por exemplo, estão entre os sinais de alerta precoce mais comumente usados. Em sistemas complexos genéricos, eles aumentam à medida que o sistema se aproxima da mudança de regime iminente.
No entanto, esses sinais não funcionam necessariamente bem para sistemas em rede — aqueles que consistem em entidades aparentemente independentes, mas interativas. Além disso, encontrar um sinal de alerta precoce que alerte para uma mudança de regime iminente não é um problema tão difícil quanto encontrar um que preveja quantitativamente quando uma mudança de regime ocorrerá. Trabalhos recentes em ecologia abordaram o último problema desenvolvendo um modelo preditivo, ainda pouco utilizado.
Uma tendência atual na pesquisa de sinais de alerta precoce é recorrer o Machine Learning. Já existem algoritmos de Deep Learning capazes de identificar mudanças de regime e fornecer sinais de alerta precoce trabalhando com dados de uma série de diferentes sistemas complexos. No entanto, métodos anteriores de aprendizado de máquina não conseguiam abordar a previsão quantitativa de mudanças de regime para várias dinâmica em redes. O que uma equipe de pesquisadores chineses acaba de conseguir.
O modelo de Deep Learning desenvolvido por eles pode prever pontos de inflexão em sistemas com centenas de partes interativas — um salto além dos métodos anteriores que eram limitados a cenários simples. O algoritmo previu com precisão mudanças repentinas em três sistemas complexos: comportamento rítmico coordenado, recursos do ecossistema e padrões de atividade cerebral. Quando testado em padrões de vegetação africanos, ele antecipou limites críticos de precipitação muito antes que as transições ocorressem, com baixos erros de previsão.
“Este é um importante passo à frente em nossa capacidade de prever e potencialmente prevenir mudanças catastróficas em tudo, desde sistemas climáticos até mercados financeiros”, comenta Eduardo Abbud, cofundador da 7D Analytics.
Os pesquisadores também conseguiram mostraram a capacidade de transferência do modelo usado — o que significa que ele pode usar o conhecimento obtido em uma tarefa anterior para melhorar o desempenho em uma relacionada. Essa capacidade de transferência de aprendizagem é importante porque, quando queremos prever o ponto de inflexão em uma situação nova, observações de longo prazo podem não estar disponíveis. Nessa situação, o pré-treinamento do preditor de rede neural com dados diferentes, mas relacionados — e suficientemente abundantes — deixaria o algoritmo pronto para que ele pudesse ter sucesso razoavelmente com uma quantidade relativamente pequena de dados do sistema de destino.
O que vem depois? Os pesquisadores discutiram sua meta de diminuir o comprimento de dados necessário, que eles atualmente definem para 20 pontos de tempo por nó. “Esta é uma direção de pesquisa importante porque apenas alguns pontos de dados por nó podem estar disponíveis em um determinado ambiente antes que ele mude gradualmente para um estado diferente”, comenta Abbud. Além disso, alguns nós podem ser mais úteis do que outros para construir sinais de alerta precoce.
O trabalho futuro também incluirá melhorar o aprendizado de transferência em diferentes redes, como aquelas que têm diferentes números de nós e diferentes dinâmicas. Vale acompanhar.